sábado, 28 de fevereiro de 2009

Sísifo e o Gauchão

Há uma cidade, Éfira, no meio da Argos apascentadora de cavalos
Lá viveu Sísifo, o mais ardiloso dos homens
(Ilíada)


Contemplando suas oliveiras em alguma tarde ociosa de algum ano arcaico, os gregos antigos pensavam “que tédio!”. Resolveram então criar competições esportivas, guerras, a pornografia (ou quase) e a sua mitologia. Um dos mitos fala sobre Sísifo, fundador de Éfira (Corinto), e a sua desgraça eterna.

Promotor da navegação e do comércio, inventor dos Jogos Ístmicos, mas também um assassino de viajantes e hóspedes de seu reino, o mesquinho Sísifo alvoroçou o Olimpo quando ousou revelar os segredos dos deuses aos homens. Furioso como não ficava nem nos seus dias de constipação mais violenta, Zeus enviou Tânatos, a personificação da morte, para carregar o herege às cruéis e olvidadas profundezas do terrível Mundo Subterrâneo. Aquilo foi rebatizado na era cristã como Inferno, mas a sociedade contemporânea conhece pelo nome de Série D.

Sísifo, entretanto, era “o mais ardiloso dos homens”. Usando de uma MALEMOLÊNCIA que faria o mais hábil driblador carioca chorar por humilhação, chamou Tânatos num canto e elogiou a sua beleza. Com o gelo quebrado e os ares mais alegres, Sísifo disse algo como “esse colar FÚCSIA vai dar um caimento que é uma beleza no seu corpitcho” e pediu para colocá-lo no pescoço da divindade, como enfeite.

Tratava-se de uma coleira. Sísifo aprisionou Tânatos, continuou vivo e, nas semanas seguintes, houve regozijo geral, bebedeiras sem temor e orgias por toda a terra, já que ninguém mais morria. Nas profundezas da quarta divisão, o soberano do Mundo Subterrâneo Hades recorreu ao presidente do STJD dos deuses e avisou que com aquele efeito suspensivo não dava mais para trabalhar, que daquele jeito teria que fechar as portas, e que se não houvesse providências apelaria para ignorância.

Zeus, político, liberou Tânatos, que imediatamente entregou Sísifo nas mãos de Hades. Só que aquilo era uma novela parecida com a contratação de Maxi López pelo Grêmio, e o astuto Sísifo já tinha um plano de ação: em segredo, pedira à esposa que não lhe enterrasse. Uma vez no inferno arcaico, ajoelhou-se aos pés de Hades e implorou por apenas mais um dia de vida, um único dia em que se vingaria da maldita que não havia sido capaz de lhe dar a dignidade de uns rituais fúnebres.

Eram tempos mais inocentes e, Hades, tido por impiedoso e insensível como um volante do Bagé, daquela vez fraquejou e caiu feito um patinho. Sísifo retornou à vida, pegou a esposa, correu, correu e correu de um jeito que só milênios depois se veria semelhante, com os laterais que cobrem todos os espaços entre as duas linhas de fundo, e venceu a morte pela segunda vez. Sumiu do mapa e, embora não fosse dos tempos de contos de fada, viveu feliz para sempre. O azar dos mortais é que eles são, bom, mortais – e o “sempre” de uma vida dura a extensão dela própria. Passados alguns anos, Sísifo retornou ao Mundo Subterrâneo naturalmente, morrendo de velhice.

Hades riu. Encarando os auditores do STJD do Olimpo, Sísifo ouviu a sentença definitiva, escolhida de forma unânime: estava condenado a levar uma enorme pedra de mármore ao alto de uma montanha. Pela eternidade. E cada vez que a pedra estivesse se aproximando do topo, ela seria conduzida por uma força incontrolável e rolaria de volta até o nível do chão, obrigando-o a reiniciar o trabalho.

A maior das desgraças: realizar um trabalho pesado, exaustivo, repetitivo e... inútil. Se as notícias do Gauchão chegam até a montanha onde Sísifo continua rolando seu pedregulho, ele deve considerar os clubes do interior parceiros em sua sina. Desde 1955, todos os estaduais tiveram pelo menos um time da Dupla Gre-Nal como campeão ou vice. Significa dizer que, com o Campeonato Gaúcho tendo o formato moderno, longo, adotado em 1961, Grêmio ou Inter ou ambos SEMPRE estiveram em alguma das duas primeiras posições. Em 2009, de novo o árduo esforço interiorano para destruir a hegemonia deu em nada. Os animadores Ypiranga e Santa Cruz caíram cedo, enquanto os surpreendentes Novo Hamburgo e Veranópolis não sobreviveram às semifinais na capital, disputadas quinta e sexta-feira. Grêmio e Inter decidirão o primeiro turno em Clássico. Garantem que, como de costume, um deles estará na final. Os Sísifos do interior observarão o jogo de domingo como mais um rolar da pedra montanha abaixo.

quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009

Está Escrito nos Gomos

Postulado 5°
“Se estiver ganhando a peleja; 2 a partir dos 15’ do 2°; 3 tua equipa deverá valer-se da retranca”

imagem: a várzea, onde a retranca deve ter surgido, pela falta de qualidade dos craques, arquivo Futebesteirol

"Los astros estuvieron con la U anoche"

Os jornais chilenos não esconderam a felicidade causada pelo enigmático empate conquistado pela Universidad de Chile, ontem, em Porto Alegre. El Mercurio, um dos mais tradicionais periódicos de Santiago, admitiu o explícito domínio do Grêmio na partida: "La cancha del Olímpico parecía una estancia y Juan Manuel Olivera (o único atacante) miraba todo de lejos y solitario."

Nem a evidência do bombardeio e a certeza de que a sorte contribuiu e muito para a manutenção do 0-0 impediram a demonstração de orgulho por um resultado honroso de uma equipe local como visitante na Copa Libertadores: "Como en los viejos tiempos, los azules (la U) amontonaron mucha gente en campo proprio y lograron una igualdad frente al equipe más fuerte del Grupo 7.", estampava o caderno de esportes do mesmo jornal.

O técnico Sergio Markarián, "el Mago", reconheceu que, apesar da importância do resultado, a resignação da sua equipe frente a superioridade gremista por pouco não custou a derrota. Coube ao presidente da Universidad, Federico Valdez, a maior valorização do empenho defensivo da equipe: "Volvemos a Santiago con un punto de oro, pero sobre todo con el convencimiento de que ésta es la U que nos gusta a los hinchas."

Finalizadores enfeitiçados

PORTO ALEGRE – Feitiçaria existe. Aconteceu na minha frente. Eu juro! Há mais de trinta e três mil testemunhas que podem confirmar cada palavra e cada vírgula dessa incredulidade. Em todos os meus anos de estádios, não lembro de uma partida entre duas equipes profissionais tão desnivelada em número de chances quanto o Grêmio e Universidad de Chile desta quarta-feira. Pudesse incluir amadores, aí sim: compararia o jogo de ontem ao Ipiranga de Coronel Barros 0-7 Santo Ângelo, com os chilenos sendo os coronel-barrenses da vez.

Para chegar a Porto Alegre eu precisei percorrer quase quatrocentos quilômetros, subir a serra, descer a serra, comer biscoitos uruguaios com gosto de óleo diesel, parar em um hotel para passar esta madrugada. Para chegar ao gol do Universidad, o Grêmio não teve qualquer problema. No minuto treze de partida, os gaúchos já contavam SETE chances mais claras que as carecas de Ruy e Alex Mineiro juntas. Com direito a um lance de placa de Jonas junto à linha de fundo, cruzando para a pequena área, onde alguém deveria aparecer chutando, mas não apareceu. Esta e as outras seis oportunidades dos minutos iniciais, todas elas desperdiçadas.

A pressão do início não foi reflexo do entusiasmo de um time empurrado pela torcida estreando na maior competição do continente. Foi reflexo de um time muito superior ao adversário PASSANDO POR CIMA das linhas defensivas dele e bombardeando a sua meta. O quadro do Chile parecia tomado de um medo cênico. A ironia de toda a partida foi um Grêmio superior disposto a morrer pela vitória, e um Universidad fraco mantendo-se vivo até os limites da possibilidade. Dentro desses objetivos, os dois times lutaram. Como convém numa partida de La Copa. Esta foi a minha primeira vez dentro de um estádio para uma jornada de Libertadores. Até agora, a Segundona Gaúcha reinava absoluta como meu parâmetro de raça e briga máximas num campo de futebol. Agora, modifico: a Libertadores e o quadrangular final da Segundona são as coisas mais peleadas que se podem ver.

Para desespero das viúvas do lesionado William Magrão, o volante Adílson esteve entre os mais envolvidos por esse espírito. Gigantesca a sua atuação, roubando e recuperando bolas improváveis, especialmente no primeiro tempo, e saindo bem para a partida. O que Adílson faz menos que Magrão é chegar ao ataque, mas isso não representou qualquer diferença nesta noite. Antes do fim da etapa inicial, o Grêmio quase abriria o placar em mais três ocasiões, acertando até o poste, aos 44 minutos. O Universidad de Chile inexistia, enquanto o Olímpico daqueles momentos fazia-se de mostra viva e ondulante do que a história das Copas nomeou CALDERÓN DEL DIABLO. Os diabos de ontem contrariavam a convenção e eram azuis. “Ondulante” – gosto e repito este termo, porque é exatamente isso que acontece no estádio do Grêmio quando a torcida se põe a pular e cantar em conjunto: o velho concreto erguido na Azenha balança, arriscando um desabamento que nunca ocorre(u).
O quarto de hora do intervalo deveria ser o momento para matar a irresponsabilidade. A partir dali não haveria paliativos, não se poderia depender de um tempo extra. Perder chances no segundo tempo era condenar os pontos de um jogo que, pelo mostrado até ali, TINHA que ser vencido. Mas o Grêmio continuou perdendo todas as suas chances. Não porque quisesse. Claro, a displicência de certos lances, como a bola que Jonas “atrasou” para o goleiro chileno aos 74 minutos, emendando um cruzamento, era parte da irresponsabilidade. Outros, porém, só podem ser explicados pelo feitiço – porque se aquilo for azar, é melhor passar bem longe dos jogadores gremistas. Souza foi privado de abrir o placar aos 48 minutos por um desvio do arqueiro, que mandou sua cobrança de falta no travessão; a zaga visitante salvou um gol certo sobre a linha aos 52, e as rebatidas seguintes na área levaram todo o estádio à loucura; finalmente, o matador Alex Mineiro pareceu uma MOÇOILA chutando a pelota depois de driblar o goleiro e ficar com o gol aberto aos 64 minutos. Seu tiro fraco possibilitou que um zagueiro corresse para afastar o perigo.

Nada tirava os universitários chilenos da defesa, no que foi uma certa decepção proporcionada pelo suposto melhor estrangeiro do grupo. Marcelo Díaz foi expulso no minuto 71, multiplicando várias vezes o drama. O goleiro Miguel Pinto passou a acumular grandes defesas, enquanto seus defensores resolveram se atirar em TODAS as bolas chutadas pelo ataque gremista, buscando evitar o gol de alguma forma. Celso Roth fez do Grêmio uma ode ao ofensivismo, deixando só um zagueiro em campo e inventando o revolucionário esquema 1-6-3, mas não teve sucesso. O domínio absoluto gremista do início ao fim, suas mais de duas dezenas de oportunidades contra nenhuma dos chilenos, valeu só para criar perspectivas. Ao fim do jogo os numerosos aplausos reconheciam o potencial de uma equipe que massacrou os oponentes, mas não deixavam de ser condescendentes com uns jogadores que, sem saber vencer, saíram de campo sob um placar que atestava uma igualdade que não houve: zero a zero.

O jogo de ontem foi um Gre-Nal de Erechim maximizado. Em ambas as partidas, as duas únicas do Grêmio contra adversários teoricamente de bom nível em 2009, o tricolor jogou melhor, criou mais chances, e ficou sem a vitória. No Colosso da Lagoa o Inter mostrou um futebol enorme comparado ao do Universidad ontem, até por isso venceu, diferentemente dos chilenos, mas os dois jogos trouxeram uma tendência inicial para o Grêmio: os comandados de Roth conseguiram submeter os oponentes ao seu ritmo e chegar à goleira adversária com desenvoltura – a BROCHADA ocorreu na hora de encarar o gol e soltar a patada. Inexplicáveis, inacreditáveis, embasbacantes os desperdícios da quarta-feira.

Não está escrito nos gomos, mas é requisito básico para uma equipe vencedora: deve-se transformar qualidade em gols. “Quem não faz, leva”, etcétera e tal, e foi por isso que, mesmo sem ter visto seu time sofrer qualquer ameaça em toda a partida, um gremista soltou a frase, enquanto saía do Olímpico após o 0 a 0 de ontem:

– Pelo menos, não perdemos.

quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Ilusão pós-carnaval

Quando os mais de trinta mil gremistas esperados para esta noite avistarem a imensa bandeira tricolor na Azenha e adentrarem em massa os portões do Estádio Olímpico, é sinal de que mais uma histórica Copa Libertadores iniciou para o Grêmio. Histórica pelo tamanho das pretensões e do investimento do novo presidente, Duda Kroeff, que montou uma equipe mais forte do que em 2007, ano em que o Grêmio, depois de estrear em uma partida que honrou o TUTORIAL da Libertadores, rumou aos trancos e barrancos até a decisão. Há também a possibilidade de ser a última Copa disputada no Olímpico Monumental – a Arena pede passagem.

O adversário da noite engrandece desde já a trajetória azul: a Universidad de Chile, cujo escudo pode ser resumido como "uma coruja em cima de um U" promete ser o principal oponente em um grupo de poucas ameaças. O onze chileno, treinado pelo uruguaio Sergio Markarian – o maior salário da equipe – desembarcou em Porto Alegre em busca de ao menos um ponto. Seus torcedores, mais ousados, chegaram à Capital sem ingresso e buscam alternativas para assistirem ao confronto sem comprometerem seus pesos chilenos. Com alguns selecionáveis no elenco e uma defesa consistente, La U deverá ser um teste interessante para o ataque gremista que até agora só encontrou Juventude's pelo caminho.

Às 21:50 desta quarta-feira de cinzas renasce a ilusão do tri da América, a maior obsessão dos gremistas na atualidade. Conquista que passa por adversários mais badalados como Boca Juniors e São Paulo, os dois maiores clubes do continente nos anos dois mil, por duras peleias no Parque Central de Montevideo, por perigos da altitude, pela gordura de Fabianni e pela habilidade de Buonanotte, pela velha e assustadora La Plata e pelo largo gramado do Mineirão, mas que tem seu início hoje, em Porto Alegre. Em uma Libertadores farta de expectativas e de candidatos, o Grêmio busca tornar-se o oitavo clube sul-americano a vislumbrar três ou mais copas em seu memorial.

terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Ist Krieg!

A expressão alemã do título deste texto retrata fielmente o que é tentar escrever uma coisa que preste, tenha um conteúdo razoável e que seja digna de postar no Futebesteirol. É uma verdadeira guerra contra si mesmo. Como diz o Brum: “antes não escrever nada do que escrever algo ruim”. Esta frase dele é uma verdade infeliz, porém certos assuntos são bons demais para deixar passar, então após momentos de reflexão decidi que valia a pena escrever, por mais que o talento (ou a falta dele) teimasse em mostrar o contrário.

Enfim, a expressão alemã supracitada pode também ser empregada para descrever a atual situação na Bundesliga alemã, com os seus sete postulantes ao título: Hamburgo, TSG Hoffenheim, Hertha Berlin, Bayern München, Bayer Leverkusen, Wolfsburg e Stuttgart.

Míseros nove pontos, ou seja, três vitórias, separam o Stuttgart, sétimo colocado com trinta e três pontos do novo líder Hamburgo, que tem quarenta e dois. O Hamburgo que outrora fora líder do campeonato retomou o posto após uma vitória apertada, mas convincente, sobre o Bayer Leverkusen em plena BayArena, no domingo.

Com um belo gol marcado por Marcell Jansen, logo a dezoito minutos de jogo, o Hamburgo largou em vantagem. Ela durou apenas doze minutos, pois Patrick Helmes, um dos bons atacantes alemães da nova geração, empatou para o Leverkusen. A confirmação da superioridade do Hamburgo veio aos 67 minutos, novamente através dos pés de Jansen.

O resultado de 2 a 1 faz o Hamburgo livrar dois pontos dos antigos líderes: o TSG Hoffenheim e o Hertha Berlin, que não venceram no fim de semana. O time da capital tinha conseguido uma magnífica e importante vitória sobre o Bayern München na rodada anterior, assumindo então a liderança do campeonato. O Hertha, que não conta com um time badalado como os bávaros, vem fazendo uma incrível campanha, tendo como destaques o atacante ucraniano Andriy Voronin e o ponta direita Patrick Ebert, revelado nas categorias de base. O jovem de 21 anos tem tudo para se tornar um dos bons jogadores alemães da geração.

Em outro jogo disputado pela vigésima primeira rodada da Bundesliga, o Hoffenheim, sensação do campeonato, foi a Stuttgart enfrentar os donos da casa. Um jogo atípico, empate em três a três. O atacante senegalês Demba Ba marcou os três do Hoffenheim, que é o melhor ataque da competição com quarenta e nove gols. A dupla de ataque do Hoffenheim é considerada uma das melhores da Alemanha, Sejad Ibisevic e sua espantosa média de 1,12 gols por jogo e Ba fizeram 29 dos 49 gols do pequeno time.

Na Alemanha, faltando doze rodadas, sete times estão em uma guerra pelo título. E eu em uma guerra contra mim mesmo. Às vezes acho que devo me reservar a apenas acompanhar os campeonatos europeus...

Está Escrito nos Gomos

Postulado 4°
“Se te tornares jogador profissional e te perguntarem sobre ídolos responda: 2 um deles terá de ser um campeão do mundo de 1970 da mesma posição tua; 3 outro será o atual queridinho da imprensa na tua posição; 4 e o último será um companheiro de clube.”
***
imagem: Túlio Maravilha, o Cícero que o Deus do futebol criou (O Perdigão é Jesus)

segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009

Entrevista Futebesteirol: Mazarópi

Faltavam uns quinze minutos para as quatro da tarde quando eu cheguei ao estádio Ervino Kronbauer, em Coronel Barros, para acompanhar a partida entre o Ipiranga de lá e o Santo Ângelo. Sobre o gramado ainda corria um jogo preliminar, com equipes de categorias inferiores. E não tinha cara de acabar a tempo de a partida principal ser iniciada às quatro em ponto, como estava previsto. Sentado à frente dos vestiários, Mazarópi*, o treinador dos missioneiros, me disse: “deve começar às quatro e meia”.

Era a minha deixa. Com um atraso daqueles, poderia fazer tranquilamente a entrevista pretendida. Vendo a preliminar ser jogada, eu e Mazarópi (recuso-me a identificar quem é quem na foto-de-fã acima) conversamos por alguns minutos. Fosse em outra ocasião, perguntaria muito mais sobre o passado no Grêmio e os episódios gloriosos, mas ontem o que interessava mesmo era saber como está o Santo Ângelo, protagonista de tantas batalhas da minha infância contra o São Luiz no 19 de Outubro, no seu retorno ao futebol e na sua preparação para a Segundona. Abaixo, então, a entrevista concedida pelo ex-goleiro e atual treinador ao Futebesteirol:

Futebesteirol: Nós sabemos as dificuldades financeiras que o Santo Ângelo tem: o clube não disputou a Segundona no ano passado e está voltando agora. Como foi a montagem do time para este ano, e como está sendo a evolução nesta pré-temporada?

Mazarópi: A montagem da equipe, nós tivemos que iniciar tudo da estaca zero. O clube ficou sem a participação no ano passado, e todo o recomeço é difícil, é complicado. Nós tivemos que montar todo um grupo de trabalho visando a competição no ano de 2009. Dentro do nosso planejamento, essas coisas estão correndo normalmente: a fase de preparação e os trabalhos físicos e técnicos durante a semana, e os jogos aos finais de semana, para ir dando ritmo aos jogadores, que também servem de avaliação para ver o estágio em que a equipe se encontra e ir corrigindo os erros que surgem, para que possamos entrar num estágio considerado razoável para o início de temporada.

Futebesteirol: Vocês fizeram dois amistosos. Hoje (ontem) vai ser o terceiro e tem mais um previsto. O jornal A Tribuna, de Santo Ângelo, publicou que a direção estaria tentando convidar o São Luiz para esse jogo. Vai ser contra o São Luiz mesmo? (Ver nota 1)

Mazarópi: Sim, nós fizemos dois amistosos. Eu pedi mais dois jogos. Tem dia 28 contra o TAC (Três Passos), que é um jogo numa situação excepcional, porque é em benefício a um gurizinho que necessita do apoio de todos nós, de ajuda para o seu tratamento. Não seria interessante você fazer amistosos com equipes da sua chave, como é o TAC, mas é uma situação excepcional, né, é um jogo beneficente e por isso nós concordamos em realizar esse amistoso. E eu gostaria de fazer um outro contra uma equipe profissional, e a direção está vendo da possibilidade ou não.

Futebesteirol: Quais jogadores estão brilhando mais nesse início?

Mazarópi: Eu acho que o grupo de jogadores tem se dedicado com bastante afinco, nós não temos a preocupação de estar buscando um ou outro jogador que esteja se destacando. O nosso objetivo aqui é o grupo, e nós temos que ter atenção com todo o grupo, dar condições a todos eles, porque sabemos a dificuldade que é a competição. Todos têm que estar preparados em igualdade de condições, para quando solicitado darem a resposta que todos nós esperamos.

Futebesteirol: Mas a equipe tem algum líder natural?

Mazarópi: Nós temos jogadores que têm mais experiência, que são mais jogados e que fazem a parte de motivação, de orientação, de apoio para aqueles mais novos. É importante essa mescla, para justamente dar tranquilidade àqueles mais novos, dar a experiência, contribuir com a sua vivência dentro da competição, para que eles possam ter a tranquilidade de desenvolver o potencial que cada um deles tem.

Futebesteirol: Muitas pessoas criticam a realização de amistosos contra equipes amadoras. Para o senhor, qual o ganho de uma partida como a de hoje? Vale o risco?

Mazarópi: Ela é importante para colocar a equipe em atividade. Eu gosto de jogar contra equipes mais fortes também, por isso pedimos um amistoso mais forte para a direção. Mas isso vai muito da possibilidade. Às vezes a distância também é complicada, porque nós temos aqui na nossa região os clubes que estão na nossa chave da Segundona, e não é interessante você fazer amistoso para a competição com equipes da sua chave. Mas eu acho que é válido (um jogo contra amadores), porque está dentro de um planejamento de preparação. Esses jogos servem pra gente ir fazendo observações, colocando jogadores em atividade contra equipes diferentes e jogadores diferentes, porque no dia a dia os jogadores vão se conhecendo e dificulta o trabalho no cotidiano. Então você tendo a oportunidade de fazer amistosos assim, é sempre importante para ver qual vai ser a reação deles, qual vai ser a movimentação, o desempenho, a desenvoltura da equipe, e a gente faz as observações e as correções que forem necessárias para aquilo que nós pretendemos na competição.

Futebesteirol: Em 2009, um exemplo de equipe que saiu da Segundona e vem fazendo um bom estadual foi o Ypiranga de Erechim, mantendo o Tonho como treinador por lá, num trabalho de longo prazo. Você percebe um trabalho no Santo Ângelo visando o sucesso no longo prazo, ou por enquanto a preocupação é só a re-estruturação básica mesmo?

Mazarópi: Para todo o trabalho é importante uma continuidade, para que você possa ter o tempo suficiente e hábil para ir preparando uma equipe para o objetivo que se tem. Mas o futebol brasileiro é um futebol imediatista, ele vive de resultados, e às vezes é mais fácil a troca de um treinador, para dar uma satisfação, em detrimento a uma continuidade e a uma convicção do trabalho que você pretende. Mas eu não estou preocupado com isso. Eu acho que o importante é você fazer o seu trabalho, ter a confiança no seu trabalho, procurar fazê-lo com tranquilidade e passar tranquilidade pros jogadores. O que vem depois é outra coisa. Eu me preocupo muito com o momento, e o nosso momento agora é a preocupação de preparar a equipe para iniciar a competição.

Futebesteirol: Muita gente gostaria de ver você de volta ao Grêmio, nem que fosse como treinador de goleiros...

Mazarópi: Quando você inicia uma carreira você está sempre buscando uma coisa a mais. E eu não fujo à regra. Todo mundo sabe o carinho, o amor que eu tenho pelo Grêmio, a minha proximidade com o Grêmio, e se houver oportunidade eu, sem sombra de dúvidas, retornarei ao Grêmio com a maior satisfação e a maior alegria.

Futebesteirol: Há um episódio pouco conhecido na história do Grêmio: dois dias depois do Mundial em 1983, teve um jogo em Los Angeles contra o América do México, valendo troféu, e a partida terminou empatada. Consta que o presidente Fábio Koff estaria disposto a entregar a taça pro adversário e o senhor teria pedido para disputar os pênaltis e salvou o Grêmio nas cobranças. Como foi isso? (Ver nota 2)

Mazarópi: Na verdade, eu não fiz pedido nenhum. O doutor Fábio que gentilmente quis oferecer o troféu à equipe do América e eles não aceitaram. Eles diziam que queriam ganhar dos campeões do mundo. E aí eu disse pra ele: “então vamos disputar, doutor Fábio, que nós vamos levar também, porque eu vou pegar logo uns dois pênaltis e levamos esse caneco também, mais um pra coleção do Grêmio”. E foi o que aconteceu. Não que eu tivesse pedido, o doutor Fábio que quis oferecer e eles não aceitaram porque queriam ir pros pênaltis... e eu procurei fazer a minha parte. Fui feliz, defendi duas penalidades e o Grêmio ganhou o torneio e trouxe mais um troféu.

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* Geraldo Pereira de Matos Filho, o Mazarópi, foi goleiro profissional por 22 anos, entre 1970 e 1992. Defendeu clubes como Vasco da Gama, Coritiba, Grêmio e Náutico, conquistando diversos títulos estaduais em cada um deles. Compôs o elenco vascaíno na conquista do Campeonato Brasileiro de 1974. Está na calçada da fama do Grêmio, por conta de títulos como a Libertadores e o Mundial de 1983, a Copa do Brasil de 1989 e o hexacampeonato gaúcho entre 1985 e 1990. Segundo a IFFHS, é dono do maior recorde de invencibilidade de um goleiro na história do futebol – 1816 minutos pelo Vasco, entre 1977 e 1978. Encerrada a carreira como jogador, Mazarópi foi treinador de goleiros no Japão por muitos anos e, desde a metade desta década, vem tentando engrenar como técnico em clubes do interior. Passou por Sapucaiense (RS), Vilhena (RO), Guarani de Venâncio Aires (RS) e comanda a SER Santo Ângelo desde dezembro passado.

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Notas:

1. Segundo noticiado, esse jogo poderia ocorrer no dia 26, o que Mazarópi desmentiu, a princípio.
2. Em 13/12/1983, retornando de Tóquio, onde vencera o Mundial, o Grêmio parou nos Estados Unidos e enfrentou o América do México, disputando a Taça Los Angeles, considerada por muitos uma edição não-oficial da Copa Interamericana – o troféu era o mesmo, embora o América não fosse campeão da CONCACAF. O tricolor empatou por 2-2 no tempo normal e venceu por 4-3 nos pênaltis.

Está Escrito nos Gomos

Postulado 3°
“Se teu time estiver ganhando 2 saca um meia ou um atacante para por um zagueiro ou volante; 3 se estiver perdendo, é só inverter”
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imagem: Alexandre Gallo, técnico do Bahia, talvez aprendesse algo lendo o Futebesteirol, futebolbahiano.blogspot.com

domingo, 22 de fevereiro de 2009

O primeiro time de Dunga, contra os profissionais

Coronel Barros é um pacato município da região noroeste do Rio Grande do Sul, emancipado de Ijuí em 1992, com população total estimada em pouco mais de 2,5 mil pessoas no ano passado. Lá, a imortal chama da paixão futebolística também existe – e é mais bem representada pelo grande clube local, o amador Ipiranga.

Quem revelou a sua história ao Futebesteirol foi o prefeito da cidade e ex-presidente do clube Olivar Scherer*, na tarde deste domingo, enquanto aguardávamos o confronto amistoso entre a equipe coronel-barrense e o profissional Santo Ângelo, que se prepara para a Segundona Gaúcha.

O futebol da localidade foi a princípio defendido por um certo Sete de Setembro, clube tido como o pioneiro de Coronel Barros. Aquela primeira equipe foi desativada no período da Segunda Guerra Mundial – muitos dos seus jogadores ainda falavam alemão e preferiram se resguardar diante da perseguição sofrida à época pelos descendentes de germânicos no Brasil. Quando o esporte ressurgiu, em 21 de abril de 1954, o fez sob o nome do Sport Club Ipiranga.

O fundador foi Hélio Wissmann, auxiliado por entusiastas das famílias Scherer, Weiler, Vontobel, Kronbauer (o estádio do clube, inclusive, chama-se Ervino Kronbauer), entre outras. Como a maior parte dos primeiros jogadores torcia para o Internacional de Porto Alegre, o escudo da equipe usava, no início, um emblema com o S, o C, e o I entrelaçados, a exemplo do colorado da capital. Só muito mais tarde o Ipiranga mudaria o escudo e o nome, adotando o atual Sociedade Esportiva e Recreativa Ipiranga.

Sem jamais interromper as atividades, o Ipiranga hoje vive de disputar amistosos e torneios citadinos ou regionais. O prefeito lamenta o sumiço de equipes tradicionais, como o Renner da Linha Oito e o Grêmio de Coronel Barros. Recorda-se dos tempos em que a localidade era distrito de Ijuí e o Ipiranga sempre participava do Campeonato Ijuiense Amador – nos anos 1970, chegou a jogar o Campeonato Polo Regional, contra equipes de Ajuricaba, Augusto Pestana, Catuípe, Santo Ângelo, Tupanciretã e Pejuçara, e foi vice-campeão.

Na atualidade, existem em Coronel Barros três equipes ativas: além do Ipiranga, há o Manda Brasa e os Amigos de Coronel Barros. Mas o prefeito Scherer avisa: “aqui, dos nossos campeonatos municipais, os que saíram o Ipiranga foi campeão”. Não é de surpreender, frente a uma estrutura tão orgulhosamente mantida apesar do amadorismo. Conta Scherer que, para mais que o futebol e o seu estádio na beira da estrada, cujo terreno foi comprado com os fundos arrecadados em festas e promoções, o Ipiranga possui uma sede social no centro da cidade. Ressalta: “o Clube Ipiranga é propriedade do time de futebol Ipiranga – os dois são a mesma entidade”.

Mas talvez o principal ponto da história do clube seja o de ter sido o primeiro pelo qual Dunga jogou. O capitão do tetra mundial em 1994 e atual treinador da Seleção Brasileira tinha 14 anos quando, em 1977, assinou a sua primeira ficha como jogador de futebol, ingressando na equipe infanto-juvenil do Ipiranga de Coronel Barros. Pouco tempo depois disputaria na sede do município de Ijuí o seu primeiro campeonato pela categoria, indo a seguir ao também amador Ouro Verde, do Bairro Assis Brasil, para depois começar a vitoriosa carreira profissional.Olivar Scherer considera a presença de Dunga nos registros do clube “um dado muito importante na história do Ipiranga”, e nos presenteia com um relato das primeiras partidas do volante no campinho de Coronel Barros: “Lembro-me perfeitamente, um dia nós sentados nesses bancos. O Valdir Aguirre, que era o padrinho do Dunga, ao lado do Edelceu (pai de Dunga), dizia assim: ‘o meu afilhado vai dar um bom jogador, ele é um verdadeiro patrolão, só que eu tenho que botar ele em forma física; ele está muito gordo, muito largão’.” Como se viu, Aguirre não deve ter falhado na tentativa de botar Dunga na linha, e o resultado foi um jogador capaz de dar nome a toda uma era do futebol brasileiro.

Bueno. Conhecido o Ipiranga, era hora de ver como a equipe de 2009 resistiria a um amistoso diante do Santo Ângelo, um rival tradicional do São Luiz, que há alguns anos luta para sair da Segundona Gaúcha – em dificuldades financeiras, o clube não participou da edição do ano passado e, segundo o treinador Mazarópi, ex-goleiro campeão do mundo em 1983 pelo Grêmio, “teve que iniciar tudo da estaca zero”.

Mesmo assim, eram profissionais. Embora os amadores do Ipiranga jogassem com uma raça genuína, a raça que só têm os que jogam pelo amor puro e simples ao esporte, segurar seria complicadíssimo. O grande público que preferiu ir prestigiar o time local, deixando de lado a partida do Internacional que a tevê trazia, viu uma equipe lutadora, que teve dois expulsos (Polaco aos 37 minutos e Kalil aos 66 - por acordo entre os times, ambos foram substituídos por reservas para não aumentar a diferença técnica), não se acanhou em dar entradas viris, mas... terminou goleada.

Ao intervalo o Santo Ângelo vencia por 0 a 3. Williams deu um giro sobre a marcação antes de chutar para abrir o placar aos 10 minutos, Edmar dobrou a vantagem aos 30, encobrindo o goleiro Rosinei, que cobrou mal um impedimento, deixando a bola nos seus pés, e Divo ensaiou a goleada aos 38, de cabeça. Os melhores momentos do Ipiranga haviam sido um pênalti que os visitantes cobraram na trave e o goleiro salvou o rebote, aos 33 minutos (vídeo abaixo), e uma bola na trave acertada por Taison, que não é o do Inter, aos 40, no que foi o melhor ataque coronel-barrense de toda a tarde.



Enquanto as equipes descansavam dentro do próprio campo de jogo, aguardando o reinício da partida, alguns torcedores dirigiam-se à cancha de bocha localizada dentro do pavilhão do clube (foto à esquerda, acima), mostrando que ali, ao menos, eram imbatíveis. As rádios santoangelenses, que transmitiram a partida na caçamba de caminhões, tiveram trabalho para anunciar todas as substituições que viriam no segundo tempo. Numa das muitas, o Ipiranga mandou ao gramado o camisa 16 Leandro que, além de ser zagueiro, exerce as funções de vereador em Coronel Barros. Um bom vereador, provavelmente, a julgar pela convicção com que dá chutões afastando o perigo da sua área.

Nem vinte substituições, porém, reporiam o gás do Ipiranga para conseguir igualar o físico dos visitantes. No segundo tempo, o time não atacou – e levou seis gols, dos quais quatro valeram. Williams mandou um voleio para fazer 4 a 0 aos 54 minutos, Edmar colocou uma bola maravilhosa no ângulo esquerdo do goleiro reserva Alex, aos 60, e Roberto marcou o sexto e o sétimo, aos 65 e 89 minutos.

Difícil prever o que esperar do Santo Ângelo na Segundona baseado no encontro deste domingo. Mazarópi, que não mostrou desprezo à partida de hoje, disse que apesar disso já pediu para a sua direção marcar mais dois amistosos contra equipes não-amadoras. Porque, como sói ser em duelos contra amadores, hoje não houve grande exigência aos jogadores missioneiros.

Azar. Essa iniciativa dos clubes maiores de fazer amistosos nos rincões onde o profissionalismo não tem como ser sustentado, algo que o São Luiz tem repetido nos últimos anos também, é excelente. Num estado em que times como a tal Ulbra de Canoas, que mal botam trinta espectadores no estádio, disputam o estadual e vão bem, valorizar as equipes amadoras donas de história é essencial. O acanhado e bem arrumado estádio de Coronel Barros, por exemplo, encheu para ver o time local se apresentar numa partida em que tinha pouquíssimas chances de vencer. Lotou por uma paixão e uma tradição que começam cinco décadas atrás, passam por glórias, passam por Dunga, e são fortalecidas em jogos desse tipo.
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* Olivar Scherer é natural de Coronel Barros. Foi professor por 20 anos na Escola Rural local, professor e diretor na atual Escola Estadual de Ensino Médio Rui Barbosa, de Ijuí, e também trabalhou na Escola Técnica 25 de Julho. Na política, foi vereador e vice-prefeito de Ijuí. Aposentou-se como professor na época em que Coronel Barros se emancipava e foi convidado a se candidatar a prefeito. Elegeu-se três vezes, incluindo o atual mandato.

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Amanhã no Futebesteirol, uma entrevista exclusiva com Mazarópi.

Está Escrito nos Gomos

Postulado 2°
Quando o adversário estiver com a bola e perto de ti; 2 a primeira instância é falta; 3 a segunda é o desarme; 4 a terceira é cair como se ele houvesse lhe agredido; 5 e a última é culpar o companheiro”

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imagem: Mané Garrincha passa pelo adversário, que deve ter recorrido à todas as instâncias; Globoesporte.com

“O que eu vou escrever?”

Sempre que abro uma janelinha do Word e me ponho a digitar, brigo comigo mesmo – e apanho do que quero escrever. Preciso revisar meus textos quarenta e nove mil duzentas e trinta e duas vezes, contadas, para achá-los minimamente decentes e então postá-los no Futebesteirol, onde reviso outras trezentas e trinta e nove vezes, até deixar uma versão final que agrade naquele momento, mas talvez seja odiada no dia seguinte.

Havia um tempo em que nos dispúnhamos a postar até cinco coisas por dia (veja ali nos arquivos, há meses com cento e tantas entradas), a grande maioria vazia de conteúdos ou ideias. Hoje o blog é atualizado bem menos frequentemente, mas os textos devem estar melhores. Se não estão, nossa alternativa é decepar os dedos e parar de escrever. Ou, menos radical, defenestrar o computador para não ter como postar aqui. Aliás, ser atirado pela janela é o que o computador merece quando não reconhece “DEFENESTRAR” como uma palavra certa, sublinhando-a em vermelho – e ainda sugere um absurdo de fenestrar como correção.

Mas partamos do pressuposto de que estamos mais responsáveis por aquilo que publicamos. Tendo isso em mente, a dificuldade é manter esse nível razoável e “ir melhorando aos poquinhos, com trabalho em equipe e fé no Monstro de Espaguete Voador”, parafraseando os jogadores de futebol. Ninguém acessa um blog pouco acessado se vai encontrar obviedades ou as mesmas coisas que encontraria em lugares mais famosos. Daí que precisamos fazer coisas diferentes.

As viagens deste ano, a jornada europeia de 2008, essas são as minhas “coisas diferentes” preferidas. O esporte encaixotado na tevê ou em notas internéticas é muito prático para acompanhar o que acontece em plagas distantes (e dá-lhe hino do Inter), porém é mais interessante, e fácil, tirar uma visão independente do que acontece no futebol e no universo que o cerca estando no cenário e interagindo de alguma forma com os seus personagens. Oquei, é uma coisa básica. Mas às vezes é preciso dizer o que todos sabem mas não falam.

Veni, vidi e, quem sabe, vici, se o texto sair bom. Eu costumo parar antes do vici. Para mim, o texto quase nunca sai bom. Devo ter escrito mais de mil postagens aqui no blog e se tivesse que separar trinta para botar como “as melhores” não encontraria metade disto. Praticamente qualquer texto poderia ser superior ao que acaba sendo. Por vezes faltam informações, por outras eles estão pouco fluentes, muito curtos ou muito longos, ou simplesmente MAL ESCRITOS. Dizem que o inconformismo é o que faz melhorar, e como o Pirralho nunca me pagou os dez centavos mensais que prometeu para eu escrever no Futebesteirol, então tá legal.

Uma coisa que nunca pode faltar, no entanto, e desde o princípio, é a coerência. Você pode mudar de opinião desde que tenha e utilize argumentos para tanto. Você não pode é escrever uma coisa e, dois dias depois, ter que lidar com uma realidade diferente como se nada tivesse acontecido. O Ypiranga de Erechim me quebrou. Está lá na análise da primeira fase do primeiro turno: qualifiquei o Novo Hamburgo como frustrante e, para deixar explícito, comparei-o ao auriverde do Colosso da Lagoa e ao Santa Cruz. No momento, torço para que o Santa Cruz não me desiluda, porque o Ypiranga já foi.

Ontem à noite, em Erechim, o Noia deu um baile. Destruiu uma invencibilidade em casa iniciada pelo Ypiranga em maio passado e venceu por 0 a 3 – o desastre dos erechinenses foi ainda maior quando o goleiro Pitol saiu expulso e o centroavante Sharlei teve que terminar a partida no gol. Como? Como? Como o Ypiranga foi ser quase goleado (porque 0 a 3 não é goleada) em casa pelo Novo Hamburgo? Eu vi o campeonato, eu vi como o Ypiranga jogou MUITO MELHOR que o Noia na maior parte das rodadas – embora tenha perdido o confronto direto na estreia, fora de casa –, e agora vejo esse placar abrupto (sem hífen, até a morte) luzindo e classificando o time do Vale do Sinos às semifinais.

Como? Como? Como eu vou sair dessa? O que eu vou escrever? Usar o clichê de que o futebol é uma caixinha de surpresas? Não, é uma imbecilidade. Qualquer fã de BEISEBOL que assistisse à partida de ontem saberia que o Novo Hamburgo venceu por um motivo muito claro, nunca surpreendente: evidenciou ser, nem que fosse por aqueles noventa minutos, mais time – e dominou inteiramente as ações. Mas como? (eu ainda chegarei a cem comos até o fim do texto). Preciso achar uma boa desculpa para convencer as almas que lerem isso aqui da superioridade do Noia ontem sem afirmar com todas as letras que eu não entendo de futebol, pois ter visto um Ypiranga melhor na primeira fase era ver o que realmente acontecia.

(Falo eu agora na terceira pessoa, como craque de time): Sentado à frente do seu computador e vendo que este já é o terceiro parágrafo da segunda página do Word, portanto um texto longo demais para um blog, que provavelmente metade dos que começarem a ler não vai chegar ao fim, ele bate na testa e exclama: “é claro!” Põe-se a digitar e preparar um link que não o contradiz e, além disso, só reforça uma tese que defendeu anteriormente. Achando-se um gênio, conclui o texto, no quarto parágrafo da página dois:

“Como escrevi anteriormente, os times dividem-se em copeiros e ligueiros. Entra para o hall das coisas notórias que o Ypiranga deste primeiro turno, eliminado pelo Novo Hamburgo nos mata-matas depois de ser melhor que ele em toda a fase regular, não se mostrou copeiro.”

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Está Escrito nos Gomos

Postulado 1°
“Quando fores atacado e recuperar a bola; 2 se fores goleiro, a reposição deverá mirar a cabeça do zagueiro adversário; 3 se fores zagueiro sairá bonito, com um belo chutão; 4 se fores médio-campista sairá passando; 5 se fores atacante, sairá machucado”
***
imagem: Amarildo machucado na copa de 62, museudosesportes.com.br

sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

A primeira fase do primeiro turno do primeiro campeonato do ano

O título desse post, meio truncado e repetitivo, é perfeito para definir o Gauchão que, tradicionalmente, é isso mesmo: um torneio de partidas truncadas e resultados finais repetitivos. Ou dá Grêmio, ou dá Inter, com raríssimas exceções. E este não parece ser um ano de exceção. Do interior só o Ypiranga de Erechim e o Santa Cruz mostraram um futebol acima da média, e mesmo assim sem vencer o time da capital que enfrentaram (no caso, o Inter). O Veranópolis, único interiorano que venceu algum da Dupla, o fez sobre os reservas do Grêmio, o que tira metade da graça.

Nunca saberemos o que aconteceria se o Brasil de Pelotas, que aparentemente vinha formando o time mais promissor de fora de Porto Alegre, não tivesse sofrido a tragédia em janeiro, mas com os resultados mostrados até agora pode-se afirmar: segue fraco, o nosso interior. Nem por isso o campeonato está sendo menos apaixonante. Zebras de um jogo sempre poderão acontecer, e se esse um jogo for em mata-matas, já poderemos estar diante de uma história diferente - a raridade desses fatos no estadual do Rio Grande é o que os torna mais especiais quando acontecem.

No mais, a primeira fase do primeiro turno do primeiro campeonato do ano, chamada pelos torcedores vulgarmente de Primeira Etapa da Taça Fernando Carvalho do Campeonato Gaúcho (todos os termos são usados nas conversas de bar, evidentemente), destruiu um pouco a ideia de que o Grupo 1 tinha pequenos mais fortes que o Grupo 2. As condições extraordinárias do Xavante contribuíram demais para esse cenário, mas mesmo um Brasil bem não seria capaz de afirmar a tal superioridade daquela chave. Depois de confrontados os times de um grupo com os do outro, a pontuação de cada grupo é respectivamente 82 e 91 unidades - e a diferença sobe para treze pontos a favor do Grupo 2 quando tiramos os pontos da Dupla Gre-Nal.

Mas paremos de enrolar com visões gerais e analisemos, time a time, o que foi visto no Gauchão até agora. Várias das partidas do turno que acompanhamos no estádio estarão linkadas ao longo dos textos (para quem AINDA não se deu conta: no novo desenho, os trechos com links são os em preto e negritados). A poética foto que ilustra o post foi roubada do ClicRBS, tirada antes da partida São Luiz 0-1 Inter em 28 de janeiro, por Daniel Marenco. Aos times:

GRUPO 1

1º Internacional – 20
8 jogos, 6 vitórias, 2 empates, 0 derrota, 19 gols feitos, 4 gols sofridos
Maior vitória: Internacional 5-1 Caxias (15/02)
Pior derrota: -

O Inter começou o campeonato mal. Tecnicamente. Os resultados prestavam, foram sete pontos nos primeiros nove disputados, mas as atuações, convenhamos, eram decepcionantes. Jogava pouco mais que nada o Inter do início do Gauchão. Mas vencia. Quando resolveu jogar bola, só podia dar nisso: único invicto, dono da melhor defesa e do segundo melhor ataque do estadual. Embalado pelos gols de Taison, destaque do Gauchão até aqui, o Colorado converteu o Beira-Rio num terror de interioranos (foram TREZE gols nos últimos TRÊS jogos em casa) e garantiu facilmente o óbvio primeiro lugar. De quebra, venceu também o Gre-Nal de Erechim, isolando-se com a melhor campanha do primeiro turno e obtendo a vantagem de disputar todas as partidas eliminatórias da Taça Fernando Carvalho dentro de casa. Por ora, preocupa mais a derrota em Rondonópolis pela Copa do Brasil do que os oponentes do estadual.

2º Veranópolis – 12
8 jogos, 4 vitórias, 0 empate, 4 derrotas, 13 gols feitos, 15 gols sofridos
Maior vitória: Veranópolis 3-1 Grêmio (04/02)
Pior derrota: Santa Cruz 3-0 Veranópolis (07/02)

Um time que perde metade das partidas que disputa não pode ser exatamente bom. Mas um time que vence a outra metade desses jogos não pode, igualmente, ser tachado de ruim. Esse é o paradoxo do VEC no Gauchão 2009: um time instável ao extremo, capaz de perder em casa para o São Luiz levando gol de Maurício numa rodada e vencer o Grêmio com hat-trick de Dinei três dias depois. Felizmente para o time da serra, os interioranos do seu grupo não justificaram as expectativas de antes do campeonato e acabaram se revelando mais fracos que os não-portoalegrenses da chave 2: ninguém além do Inter teve saldo de gols positivo no Grupo 2 e, os 12 pontos do VEC, que o deixariam em quinto lugar na outra chave, nesta o colocaram em segundo. Bom, mas não tão bom.

3º Novo Hamburgo – 12
8 jogos, 3 vitórias, 3 empates, 2 derrotas, 10 gols feitos, 11 gols sofridos
Maior vitória: Novo Hamburgo 2-0 Caxias (04/02)
Pior derrota: Novo Hamburgo 1-5 Grêmio (01/02)

Frustrante, o Noia. Antes do campeonato, o time compartilhava com o Brasil de Pelotas a condição de maior candidato de fora de Porto Alegre e Caxias do Sul a fazer coisas grandes. O Xavante foi vitimado pelo acidente, mas o gastador Novo Hamburgo não tem qualquer desculpa: não honrou o poder anunciado. Obteve resultados sólidos, perdeu pouco, classificou-se, não é?, porém esteve muito longe de encantar e se destacar como fenômeno do interior – mesmo que Novo Hamburgo nem seja o “interior” propriamente dito. Para efeitos de comparação, fiquemos com as atuações e resultados do Ypiranga e do Santa Cruz, esses sim times que encheram os olhos dentre aqueles que não costumam brigar pela fatia maior do bolo.

4º Juventude – 11
8 jogos, 3 vitórias, 2 empates, 3 derrotas, 5 gols feitos, 5 gols sofridos
Maior vitória: Juventude 2-0 São Luiz (15/02)
Pior derrota: Grêmio 2-0 Juventude (12/02)

O Juventude é o time mais CHATO desse Gauchão. E não se usa o adjetivo para dizer que a equipe incomoda: seus jogos são verdadeiros soníferos. A equipe é ruim, portanto marca poucos gols e tem o pior ataque da competição, mas possui uma noção razoável de defesa, assim consegue manter a segunda meta menos vazada do Estado. A soma de ambos resulta em 10 gols vistos (entre feitos e sofridos) em 8 partidas, o número mais baixo entre todas as equipes da primeira divisão. O Juventude de 2008 já não era grande coisa, mas por abortos da natureza conseguiu atingir a final (onde levou um 8 a 1 condizente com o tamanho da sua qualidade). O Juventude de 2009 é pior, precisará de mais reza se quiser ir longe, e continuando com esse futebolzinho não só deixará de subir pra Série A nacional como brigará para não cair para a C. Mas os times brasileiros só contratam o péssimo técnico PC Gusmão para ter o prazer de mandá-lo embora. E demiti-lo, como o Ju fez nesta semana, sempre será um bom começo para tentar melhorar.

5º Esportivo – 10
8 jogos, 2 vitórias, 4 empates, 2 derrotas, 9 gols feitos, 13 gols sofridos
Maiores vitórias: São José 2-3 Esportivo (28/01) e Sapucaiense 2-3 Esportivo (08/02)
Pior derrota: Grêmio 5-0 Esportivo (24/01)

Esse Grupo 1 foi tão abaixo do esperado que até uma equipe PATÉTICA como é esse Esportivo de Bento Gonçalves conseguiu brigar para passar de fase até a última rodada. Oquei, estou sendo preconceituoso: a verdade é que estou até hoje com a imagem da equipe do início do Gauchão, que não tinha preparo físico, não sabia se defender, e ainda atacava em desordem plena. Serei sincero ao afirmar que desconheço como esse time evoluiu a partir da metade do primeiro turno, mas só duas vitórias paridas em difíceis placares de 2 a 3 não são um indício dos melhores. Se nada posso falar da evolução, pelo menos tenho a certeza de que não houve designer inteligente na concepção desse grupo de jogadores.

6º Avenida – 9
8 jogos, 2 vitórias, 3 empates, 3 derrotas, 13 gols feitos, 15 gols sofridos
Maior vitória: São Luiz 1-3 Avenida (08/02)
Pior derrota: Ypiranga 4-2 Avenida (28/01)

O Avenida é para o Gauchão o que o Ipatinga foi para o Brasileiro do ano passado. Entrou para não cair e deve cair. Ou deveria. Depois de fazer um início de entristecer qualquer plantador de fumo, o time verde de Santa Cruz do Sul emendou duas vitórias seguidas fora de casa, contra São Luiz e Caxias, e chegou à última rodada brigando por vaga. Não levou, o que nos garantiu que ainda resta um pouco de lógica no futebol, e no fim as suas vitórias foram mais importantes para lhe afastar do rebaixamento anunciado e para ajudar, no outro grupo, a Ulbra a se classificar.

7º Internacional de Santa Maria – 5
8 jogos, 1 vitória, 2 empates, 5 derrotas, 7 gols feitos, 14 gols sofridos
Maior vitória: Internacional-SM 2-0 Ypiranga (01/02)
Pior derrota: Ulbra 3-0 Internacional-SM (08/02)

O Inter-SM foi o PRIMOR do interior em 2008. Em 2009, empatando com o Grêmio na abertura do Gauchão, pareceu que não iria por caminho diferente, mas as rodadas seguintes trataram de destruir ilusões. Excetuado o Brasil de Pelotas, que foi afetado por todos os problemas extracampais, não houve quadro com participação pior neste primeiro turno do que o Interzinho da Baixada Melancólica. Uma equipe facilmente vencível (o bom Ypiranga de Erechim chora até hoje a absurda derrota sofrida em São Gabriel), desorganizada, com brigas na diretoria e um treinador ruim mantido por tempo demais, esse foi o seu retrato. O rebaixamento é possibilidade real, e o consolo de que no segundo turno os jogos serão contra adversários desta própria chave, teoricamente mais fáceis, vale pouco se essas semanas de paralisação não representarem avanços para a equipe.

8º Brasil de Pelotas – 3
8 jogos, 0 vitória, 3 empates, 5 derrotas, 10 gols feitos, 21 gols sofridos
Maior vitória: -
Pior derrota: Brasil 2-5 Ulbra (19/02)

Dezenove foram os dias passados do acidente do Brasil, em 15 de janeiro, para a estreia do time, em 3 de fevereiro. Dezesseis foram os dias corridos da primeira partida do Xavante no Gauchão até a sua oitava, fechando o turno, ontem à noite. Tudo está sendo intensamente rápido no cotidiano do rubro-negro pelotense por esse início de 2009. Os jogadores não têm tempo de descansar, o técnico Claudio Duarte (agora ex-técnico, já que passará a uma função mais administrativa no clube) não teve tempo de treinar uma única vez, e o Brasil fez uma maratona de viagens e jogos pelo Rio Grande. Com o elenco ainda aos pedaços e essa tabela louca, era esperada a sua fraca participação no primeiro turno, por mais que mantivéssemos um devaneio de que a raça seria capaz de fazer o milagre da multiplicação dos pontos. A questão é que agora todo o destino precisará ser definido nesses dias de parada do campeonato, fazendo-se uma intertemporada forte, porque ou se vence com alguma frequência no segundo turno ou se é rebaixado. A crueldade de um descenso neste ano não parece mais distante depois das expulsões da partida de ontem e do boato de que o novo treinador seria o mesmo Abel Ribeiro que ajudou a enterrar o Inter-SM.

GRUPO 2

1º Grêmio – 16
8 jogos, 5 vitórias, 1 empate, 2 derrotas, 20 gols feitos, 8 gols sofridos
Maior vitória: Grêmio 5-0 Esportivo (24/01)
Pior derrota: Veranópolis 3-1 Grêmio (04/02)

A patacoada do Grêmio neste Gauchão foi ter escalado reservas contra o Veranópolis, numa quarta-feira, visando o Gre-Nal do domingo seguinte. Até ali, o Grêmio somara sete pontos em três rodadas e marcara onze gols. Contra o VEC e contra o Inter, primeiro com reservas e depois com titulares que brincaram de desperdiçar gols, perdeu. Suas únicas derrotas no campeonato, dois tropeços que na realidade nunca colocaram sua classificação a perigo (o time voltou a mostrar seu melhor nível em relação aos interioranos empilhando três vitórias nas três rodadas finais), mas serviram para obrigar o Grêmio a jogar fora de casa numa possível final de turno contra o Internacional, que fez mais pontos. Como mérito, o fato de o time ter o melhor ataque do torneio.

2º Ypiranga – 16
8 jogos, 5 vitórias, 1 empate, 2 derrotas, 13 gols feitos, 8 gols sofridos
Maior vitória: Ypiranga 4-2 Avenida (28/01)
Pior derrota: Internacional-SM 2-0 Ypiranga (01/02)

Houvesse uma equação do futebol gaúcho, ela terminaria com algo como “Ypiranga 2009 = Inter-SM 2008”. A história do time erechinense neste campeonato está muito semelhante ao que viveu o Coloradinho no ano passado: recém-vindo da Segundona, entrou na elite destruindo os adversários que cruzassem o seu caminho. O Ypiranga igualou a campanha do poderoso Grêmio, obteve resultados interessantes como a vitória sobre o Juventude e o empate contra o Internacional, e poderá disputar pelo menos a primeira partida dos mata-matas do turno dentro de seu estádio, o magnífico Colosso da Lagoa. Alguns apontam a equipe como a sensação do interior... a campanha dá razão a isso e talvez o Ypiranga seja mesmo, mas eu continuo mais impressionado com o Santa Cruz – que, se não venceu tanto, perdeu menos.

3º Santa Cruz – 13
8 jogos, 3 vitórias, 4 empates, 1 derrota, 11 gols feitos, 6 gols sofridos
Maior vitória: Santa Cruz 3-0 Veranópolis (08/02)
Pior derrota: Juventude 1-0 Santa Cruz (31/01)

Nunca, jamais, em tempo algum, com todas as redundâncias possíveis e imagináveis, o Galo dos Plátanos entra no Campeonato Gaúcho como candidato a grandes coisas. Embora seja o nono time com mais participações na história dos estaduais (36), seu histórico de grandes campanhas é modesto. Inclui um terceiro lugar em 1959, uma quarta colocação em 1988, e algumas outras posições honrosas nos demais anos. Raramente o time briga para não cair, mas essa pouca tradição em chegar longe geralmente o faz ser posto na lista de cotados para disputar a Segundona do ano seguinte. Em 2009 os preconceituosos foram atorados logo de cara, quando o time empatou por 0 a 0 com o Inter em pleno Beira-Rio, na primeira rodada, e causou ótima impressão. Nas partidas seguintes, a caminhada do Santa Cruz provou que aquele resultado não era mera epopeia de interiorano querendo fazer bonito na capital: o time seguiu com atuações destacadas, praticamente imbatível – sua única derrota, para o Juventude, foi com um GOL IRREGULAR sofrido aos 88 minutos de partida. Na prática e na “justiça”, portanto, não houve time capaz de vencê-lo neste campeonato. É a menina dos meus olhos no primeiro turno do Gauchão 2009.

4º Ulbra – 13
8 jogos, 3 vitórias, 4 empates, 1 derrota, 14 gols feitos, 10 gols sofridos
Maior vitória: Brasil 2-5 Ulbra (19/02)
Pior derrota: Internacional 4-1 Ulbra (05/02)

Dois empates por zero a zero nas duas primeiras rodadas deram os indícios de que a modorrenta Ulbra (que a tevê insiste em chamar de Canoas, apesar das notas oficiais reclamando e das promessas de processos), mantida pela universidade que passa por grandes dificuldades financeiras, andaria no esperado rumo do rebaixamento. Enganamo-nos todos. Mesmo sem jogar um futebol brilhante ou qualquer coisa do tipo, o time só perdeu para o Inter (com baile) e obteve uma classificação merecida ao ARROLHAR o Brasil de Pelotas na última rodada. Repudio fortemente todos os times sem torcida, desejo a falência e o fechamento da Ulbra e do São José de Porto Alegre, mas infelizmente minhas macumbas não têm surtido grandes efeitos. Os QUATRO hinchas fiéis da equipe de Canoas (quando muito) vibram e cantam pelas ruas da cidade metropolitana com essa passagem de fase. Fazem isso enquanto é tempo, porque quando o jogo de quartas-de-final é contra o Inter no Beira-Rio, o fim da história já está escrito... a lápis, sim, mas Jé, Tatá e companhia não parecem ter uma borracha.

5º São Luiz – 11

8 jogos, 3 vitórias, 2 empates, 3 derrotas, 6 gols feitos, 7 gols sofridos
Maior vitória: São Luiz 2-0 Brasil (11/02)
Pior derrota: São Luiz 1-3 Avenida (08/02)

Ê, São Luiz, quando vais passar de fase? Vamos já para dez anos desde a última vez em que o time ijuiense não ficou estacionado na etapa inicial de um campeonato. Neste primeiro turno, como em 2008, a vaga esteve próxima e foi perdida na última rodada. Eu defenderia a tese de que isso é um castigo divino pela manutenção dos lentos Maurício e Carlos Lima na titularidade, mas quando constato que, dos seis gols da equipe, quatro foram desses dois, fico sem outro argumento a não ser dizer que o time simplesmente não é bom o bastante. Com eles de artilheiros... Enfim. Como imaginávamos no dia da derrota em casa para o triste Avenida, o São Luiz não passou de fase exatamente pela falta dos pontos desperdiçados naquele jogo. Quanto custou aquela derrota? Cem mil reais era o que a direção são-luizense estimava ganhar com a divisão da renda de um eventual jogo de quartas-de-final no Beira-Rio, contra o Inter. Uma fortuna para os padrões interioranos. Pelo menos o time não está brigando contra a queda...

6º São José – 8
8 jogos, 2 vitórias, 2 empates, 4 derrotas, 15 gols feitos, 17 gols sofridos
Maior vitória: São José 3-1 Internacional-SM (11/02)
Pior derrota: São José 1-3 Internacional (25/01)

Um time cujo ataque é formado por FABIANO e SANDRO SOTILLI tem que ser bom, precisa ser bom, nem que seja nas nossas ilusões por jogadores folclóricos. Mas quando esse time é o sem-torcida Zequinha, que só está aí para roubar pontos de interioranos, ele não pode ser bom. Então o São José é ruim, e provou isso no campo, perdendo metade das suas partidas. Chegou ao final do primeiro turno rendendo uma esperança ainda vaga de que talvez cairá, mas deve permanecer na primeira divisão. Esse é o tipo de vaso que não quebra fácil.

7º Caxias – 8
8 jogos, 2 vitórias, 2 empates, 4 derrotas, 8 gols feitos, 13 gols sofridos
Maior vitória: Caxias 4-2 Internacional-SM (25/01)
Pior derrota: Internacional 5-1 Caxias (15/02)

Bueno. O que comentar sobre o Caxias além da infame piadinha de que está sendo um time com uniforme quase cor de vinho e jogadores tipo uva? O Caxias está para o Rio Grande do Sul um pouco como o Uruguai para o futebol mundial... foi grande, foi forte, e hoje é o que é, de vez em quando aparecendo, mas na maior parte das vezes tendo que conviver com resultados pequenos demais para a sua história. Em 2009 está sendo um fiasco: míseras duas vitórias, apenas um gol por jogo em média, e o penúltimo lugar do Grupo 2. Últimos interioranos a erguer o troféu do Estado, em 2000, os grenás são a grande decepção desta temporada até aqui, mas pela tradição que construíram começarão o segundo turno cotados, novamente, à passagem de fase.

8º Sapucaiense – 6
8 jogos, 1 vitória, 3 empates, 4 derrotas, 11 gols feitos, 17 gols sofridos
Maior vitória: Sapucaiense 2-1 Internacional-SM (29/01)
Pior derrota: Internacional 4-0 Sapucaiense (01/02)

Não deixa de ser curioso que os três últimos times do Grupo 2 tenham, todos eles, suas maiores vitórias no turno em jogos contra o Inter-SM e as piores derrotas contra o Inter de Porto Alegre. Acaba sendo uma afirmação de como essa chave é mais forte, com os seus piores batendo nos piores da outra, e também de como é desproporcional a qualidade do Inter grande em relação aos ruins desse grupo. A curiosidade que interessa aqui, no entanto, é a que confirma a dificuldade para os egressos da divisão inferior em se firmar na elite: esse Sapucaiense que cambaleia uma posição acima do rebaixamento, e o tal vencido-por-todos Inter-SM, que está na zona de descenso, são os dois times que subiram da Segundona Gaúcha em 2007 e fizeram boas campanhas na primeira em 2008. O planejamento de longo prazo e, principalmente, o dinheiro (e a falta dele) são determinantes para originar essas subidas e descidas mais violentas que qualquer lomba de Ijuí.

• • •

• Classificação geral momentânea:

1º Internacional (Grupo 1)
2º Grêmio (Grupo 2)
3º Ypiranga (2)

4º Santa Cruz (2)

5º Ulbra (2)

6º Veranópolis (1)

7º Novo Hamburgo (1)

8º Juventude (1)

9º São Luiz (2)
10º Esportivo (1)
11º Avenida (1)
12º São José (2)
13º Caxias (2)
14º Sapucaiense (2)
15º Internacional-SM (1)
16º Brasil (1)


• Jogos das quartas-de-final (partidas únicas):

21/02 - 16:00 - Grêmio vs. Juventude (Olímpico, Porto Alegre)
21/02 - 20:30 - Ypiranga vs. Novo Hamburgo (Colosso da Lagoa, Erechim)
22/02 - 16:00 - Internacional vs. Ulbra (Beira-Rio, Porto Alegre)
22/02 - 18:30 - Veranópolis vs. Santa Cruz (Antônio David Farina, Veranópolis)

quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

A esperança são-luizense morreu em Pelotas… de novo

Foi no Bento Freitas, na noite da quarta-feira 26 de março de 2008, que o São Luiz perdeu a vaga na segunda fase do Gauchão daquela temporada. Empatou por 2 a 2 com o Brasil, depois de sair levando 2 a 0, mas ficou de fora dos mata-matas pelo número de vitórias, muito por culpa do Juventude, que na mesma hora perdia em casa para o ressurgido São José de Porto Alegre, um resultado que entonces classificava ambos e cortava o São Luiz da lista dos que passavam.

Foi no Bento Freitas, na noite da quinta-feira 19 de fevereiro de 2009, que o São Luiz perdeu a vaga na segunda fase do Gauchão desta temporada. Da segunda fase do primeiro turno, que agora o campeonato é dividido em duas etapas – e por isso ainda nos resta uma chance. Hoje a tarefa era mais complicada porque não envolvia o time diretamente: era preciso torcer por qualquer resultado que não a vitória da Ulbra.

E a Ulbra acabou com o Brasil de Pelotas. Dessa vez não houve a dor de um ano atrás porque em momento algum este São Luiz encantou como o de 2008. Venceu apenas uma das partidas disputadas no 19 de Outubro e merecia pouco entrar para a história como o primeiro time formado em Ijuí a superar a primeira fase do estadual desde 1999. Mas quem se importava? Futebol nunca foi justiça, queríamos a classificação e ponto.

Que por duas vezes esteve plausível, mas depois foi ficando distante, distante, distante e sumiu de vista. O Brasil levou 0 a 1, buscou, levou 1 a 2, buscou de novo, levou 2 a 3, e aí desapareceu. Com o gramado do Bento Freitas pesado em função da chuva, o Brasil debilitado fisicamente foi ainda mais inofensivo que de costume nos minutos finais. Terminou goleado como há muito tempo não era, dentro de casa: 2 a 5.



O quinto gol, por sinal, iniciou uma guerra sobre o gramado. Rogério Pereira, seu autor, foi comemorar em frente à torcida Xavante. Os jogadores rubro-negros enfureceram-se: Danrlei alegou, após a partida, que os gestos do goleador da Ulbra estariam imitando desrespeitosamente a flechada eternizada nas comemorações de Claudio Milar. Na imagem da tevê não pareceu, mas ficou nítida a provocação de Rogério Pereira aos torcedores, inclusive proferindo algumas palavras supostamente desaforadas.

Foram para cima, os atletas do Brasil. Alex Martins trocou socos com Rogério Pereira num duelo de causar inveja no boxe. Tapas, chutes, voadoras, garrafadas, até com o médico do time pelotense envolvendo-se na confusão, sobraram nos minutos seguintes, que estenderam a partida até os 90+18. Foi lamentável. Agradam-me as brigas do futebol, não vou bancar o correto e dizer que as abomino, que o jogo sempre tem que ser bonito e tal – de vez em quando, a luta também faz parte, mas essa foi uma lástima. A situação do Brasil no campeonato é tão ruim que ver seus próprios jogadores empenhando-se em piorá-la só prestou para destruir parte da compaixão para com o time.

O saldo da confusão foi de seis expulsões. Do Brasil saíram Danrlei, Gleidson, Alex Martins, e o goleiro reserva Luciano, o que desfalcará seriamente o arco Xavante no início do returno. Da Ulbra foram mandados para a rua o goleiro reserva Juninho e, incrivelmente, Henrique – que não agrediu ninguém e só entrou na briga para apartar. Em compensação, o Rogério Pereira que causou tudo fugiu para os vestiários por orientação do treinador e, ao menos dentro de campo, não foi expulso.

Já tem grand finale o primeiro turno terrível do Brasil. O segundo, com um calendário menos cruel, pode ser melhor, tem que ser melhor para evitar o rebaixamento, mas, depois dos cartões vermelhos desta noite, começará com drama. A Ulbra enfrentará o Inter no Beira-Rio, devendo levar tantos gols quanto fez hoje, e o São Luiz fica no esquecimento reservado aos eliminados. Quando o time venceu pela primeira vez neste campeonato, escrevi que o acontecimento era parte de uma criação, nos torcedores, de esperanças que talvez fossem mortas nas últimas rodadas. Pena que a minha vidência não revelou que essas esperanças seriam mesmo as dos ijuienses...

Por tempo limitado, há permissão para sonhar

“De onde menos se espera, é de lá que não sai nada mesmo”. O autor dessa frase até deve ser famoso, mas eu não lembro o nome e não vale a pena pesquisar, porque ela foi destruída na noite de quarta-feira. Pela Libertadores, um Sport nunca cotado para grandes coisas internacionais (e cujo jogo não foi transmitido pelas tevês) foi ao Chile e derrubou o Colo-Colo por 1 a 2, e o favorito São Paulo quase teve o pelego arrancado pelo Independiente de Medellín no Morumbi, salvando o empate por 1 a 1 nos acréscimos. O grande lugar inesperado de onde saiu algo diferente, porém, foi o interior do Mato Grosso, onde o União de Rondonópolis bateu o Internacional por 1 a 0.

Esse jogo de Copa do Brasil, que agora se chama Copa Kia, numa homenagem involuntária ao antigo mandachuva do Corinthians/MSI, esse jogo era tão jogado que para o noticiário gaúcho parecia importar mais o avião fretado pelo Inter do que a própria preparação para a partida. Do União, dizia-se o clichê dos times mato-grossenses quando encaram adversários do sul: a direção e a torcida estavam repletas de colorados, e o time não poderia fazer frente ao Inter.

Até porque vinha mal. Embora Rondonópolis seja rica o suficiente para manter três times ativos no estadual de lá, e o União seja o clube que mais gasta no Mato Grosso (só para ter Odvan, que é Odvan, paga QUINZE MIL REAIS), os resultados têm deprimido: em seis rodadas do Mato-Grossense, só uma vitória. Com o time em sexto lugar num grupo em que o sétimo e o oitavo são rebaixados, não poderia dar outra além de demissão do treinador que começou 2009 no comando da equipe. Ex-jogador do Grêmio, que chegou a dizer que queria golear o Inter na Copa, Valdo foi o técnico guilhotinado ainda na semana passada, antes do torneio eliminatório, e substituído por Zé Humberto.

Além do momento, há a história negativa do rubro rondonopolitano. No site oficial do clube você pode encontrar a letra do hino, e uma das linhas diz: Vibra União, mais uma vês ele vai ser o campeão – a missão aí é saber se o absurdo maior foi trocar o substantivo vez pelo verbo ver ou se é dizer que o time vai ser campeão de novo. Porque o União nunca foi campeão do torneio que interessa, o estadual. O clube é provavelmente o mais amaldiçoado em finais na história universal, tendo sido NOVE VEZES vice-campeão da terra onde se matam grossos (1975, 1980, 1984, 1991, 1995, 1997, 2001, 2004 e 2008), jamais conquistando o título. Para piorar, seu rival citadino Vila Aurora voltou ao profissionalismo em 2001 e quatro anos depois já erguia o troféu do Estado.
Por essas e outras que os onze jogadores do time da casa, ontem à noite, eram touros que bufavam e babavam querendo a vitória nem que tivessem que coicear desde o D’Alessandro até o Vitório Píffero. Zé não poderia ter ensinado uma mecânica de jogo diferente nem um futebol melhor aos jogadores em tão pouco tempo: ficou tudo por conta da motivação natural da troca de comando somada à oportunidade de bater um time da Série A brasileira.

Assim, o União foi o único pequeno a bater um time da Série A brasileira na quarta-feira.

Depois de ver como os colorados criaram chances sucessivas e as desperdiçaram com destreza ímpar durante todo o primeiro tempo, o rubro de Rondonópolis cresceu nos quarenta e cinco minutos finais. Aos 80, cometeu o absurdo: Diogo fez 1 a 0. Abria-se a primeira vitória do União na história da Copa do Brasil. Duramente golpeada, a maldição do fracasso despertou do seu cochilo na sequência. Se não foi capaz de recuperar o resultado pro Inter, que conheceu a derrota número um do ano do centenário, ela segurou o placar: nos acréscimos, mandou na trave esquerda de Lauro a bola do sonhado segundo gol.

Mas a vitória pelo placar mínimo veio mesmo. Numa rádio rondonopolitana, ironizavam: “o Inter ganhou tudo, só não ganhou do União”. Deve ganhar na volta, em Porto Alegre, e passar de fase. Mas esta é a madrugada do União de Rondonópolis. Nela, permite-se aos realizados torcedores do clube sonhar com qualquer coisa, com o quase impossível, sonhar em avançar na Copa do Brasil e seguir derrubando adversários, quem sabe até a final. Só até aí, também. Nem na hipótese o União deixaria de ser vice.