quarta-feira, 25 de junho de 2008

A final: minuto-a-minuto

Mais uma Libertadores chega a seu fim. Como em tantas outras edições, quadros dos mais tradicionais no cenário sul-americano duelaram até apenas dois permanecerem em pé. E os finalistas de 2008 valorizaram a grandeza histórica da competição. O futebesteirol reconhece e glorifica-os com um minuto-a-minuto do primeiro embate da decisão.

Prévia: Favorecido por enfrentar adversários modestos na primeira fase, o Peñarol só encontrou resistência quando enfrentou o Fluminense no Maracanã, em sua volta à América. Classificou-se como líder com certa tranquilidade, sendo seguido pelo surpreendente Audax Italiano, praticante de algo semelhante com o tiki-tiki visto em terras orientais.

O Fluminense sonhou em melhorar o retrospecto copero, mas acabou em terceiro lugar por míseros dois gols de saldo. O lanterna foi o Bolívar, que mostrou honra e apreço a grande competição que disputava, e mesmo eliminado previamente venceu o tricolor carioca nas alturas, eliminando-os por 3-1 - tripleta de Germán Vaca.

Carlos Bueno, perseguido pelos aficcionados aurinegros por supostamente assinar sua transferência em meio as oitavas-de-final, voltou atrás e recusou proposta milionária do Real Bétis espanhol. Com a cabeça salva e no Peñarol, chega na final com seis tentos anotados e a artilharia provisória da Libertadores da América.

O adversário do carbonero, o tricampeão Estudiantes de La Plata suou para classificar-se para o mata-mata. Em seu grupo, São Paulo e Colo-Colo ofereceram dificuldades e a qualificação acabou mesmo no sorteio, diante de igualdade absoluta em todos os aspectos: no papelzinho, golazo pincharata. Eliminado no acaso, Muricy Ramalho pediu demissão de seu azarado São Paulo.

Nas eliminatórias, fortuna para os de La Plata: tanto nas oitavas como nas quartas-de-final, Juan Sebástian Verón e companhia derrubaram equipes sem maior tradição continental, como a alegre Liga de Quito e o cheio de grife América mexicano. Nas semi-finais, o inevitável aconteceu, e não havia mais como escapar do Boca Juniors. Empates em 2-2 tanto no Municipal de La Plata como na Bombonera jogaram a sorte para o vento. Ou para os penais. Piatti cobrou a última com violência e o Estudiantes avançou após heróicos 6-5 na marca de cal.

Sessenta e cinco mil aficcionados já lotam as tribunas do estádio Centenário. A Amsterdam, inteiramente tingida de amarelo e negro, não suporta mais uma alma. Na Colombes a festa é em vermelho e branco. Não foi registrado nenhum incidente entre as torcidas, já que sem maiores explicações elas denominam-se aliadas. Oscar Julián Ruiz observa o cronômetro e apita o início de mais uma final da Copa.

Peñarol: Biglianti; Aguirregaray, Gerardo Alcoba, Darío Rodriguez e Maxi Arias; Mario Alvarez, Marcel Román, Antonio Pacheco e Rúben Olivera; Estoyanoff e Bueno. Técnico: Mário Saralegui.

Estudiantes: Andújar; Desabato, Alayes, Angeleri; Moreno y Fabianesi, Verón, Brãna, Galván, Gonzalo Saucedo; Pablo Piatti e Maggiolo. Técnico: Roberto Sensini.

Primeiro tempo:

01' Move o Peñarol, que ao som de Dale alegría a mi corazón, canção do argentino Fito Paez entoada por sua torcida, arranca para o ataque. Pacheco lança Estoyanoff que não alcança e desliza de carrinho provocando os primeiros aplausos.

04' Falta no lado direito de ataque para os locais. Verón chegou com muita força no tornozelo de Estoyanoff, que é atendido com certa preocupação fora do campo. José María Franco aquece. Na cobrança, Tony Pacheco acha o pescoço de Arias, que completamente sem jeito manda o esférico para a linha de fundo, sem qualquer perigo para Andújar, jaqueta 21.

06' Não deu para Fabián Estoyanoff, entra Franco em seu lugar. O ex-jogador do Deportivo La Coruña virou herói ao converter o gol da classificação para a final, nos acréscimos, sobre o Libertad paraguaio no Defensores del Chaco. Lolo chora ao ser substituído, parece ausência certa para a segunda final.

08' Na velocidade de Piatti o Estudiantes armou o primeiro contra-ataque efetivo do encontro. Após lançamento de Verón, o camisa 9 chutou para segura defesa de Biglianti, que espalmou para escanteio. Na cobrança, Aguirregaray afastou ao saltar em meio a dois zagueiros argentinos.

10' Lançamento de absurda perfeição de Verón para Maggiolo, que na meia-lua, girou e disparou um balaço no canto esquerdo inferior de Biglianti. 1-0 Estudiantes, na frente de sua numerosa torcida presente no Centenário. Após o abrupto ruído da minoria, voltam a cantar os adeptos do Peñarol.

12' Com puro huevo y poco fútbol os aurinegros jogaram-se ao ataque. Em arrancada pela esquerda, Carlos Bueno sofre falta e troca braçadas com o nada sutil Angeleri. Mais uma oportunidade para o esférico voar até a área de Angeleri.

13' Quando todos esperavam um tiro direto para a aglomeração, Pacheco surpreendeu e lançou com rapidez Olivera, aberto e sozinho pela ponta direita. El Pollo apostou carrera até o fundo e cruzou com perfeição. Franco cabeceou, mas parecia um chute. Sabe-se lá como, Andújar desviou para o alto e comemorou a defesa como um golo. E realmente era.

18' Após bela troca de passes entre Román e Olivera, o Peñarol chegou ao campo de ataque com o controle da pelota. Rúben buscou Charly Good entre os zagueiros, mas o lance sobrou para José María Franco finalizar de fora da área: novamente um tiro, mas no meio da meta. Andújar afastou estranhamente com o pé. A impaciência tomava conta do carbonero.

21' Moreno y Fabianesi recebeu toque de Braña e arrematou de muito longe. Um leve desvio em Darío Rodriguez mudou totalmente a trajetória da bola, iludindo o apavorado Biglianti, que nada pôde fazer. Mansamente, no canto direito...2-0 Estudiantes.

25' Uma remontada faz-se necessária, e os exemplos estão vivos no Centenário. Trapos relembram o 4-2 diante do River Plate, em 66, e o gol de Aguirre, em 87. Mas em campo, sobra desorganização ao Peñarol.

30' Consciente da boa vantagem atingida, o Estudiantes não sai mais tanto ao ataque. O time deixa o Peñarol jogar até o meio de campo, e então pára as investidas. O objetivo é contra-atacar, mas por enquanto, só resultou em faltas não aproveitadas pelos aurinegros.

34' Saralegui parece bradar pelo intervalo, mas restam ainda dez minutos. Bueno e Franco arriscam de longe, sem qualquer proximidade do arco argentino. Galván parece encontrar seu futebol, e suas gambetas costuram a meia cancha.

35' Em novo drible de Galván, Aguirregaray desespera-se e o atinge em um carrinho por trás, sem fazer questão de ser discreto. Ruiz apresenta o primeiro cartão amarelo da decisão. Ninguém ousou reclamar. Galván passa oito meses no chão do gramado sendo atendido.

41' A partida é um sonho para os platenses. O Centenário silenciou, o Peñarol apanha de seus próprios nervos e o futebol flui. Resistir até o intervalo é o último objetivo da primeira etapa.

47' Oscar Ruiz anuncia apenas três minutos de descontos, para desespero das três tribunas ocupadas por uruguaios. Resta uma última jogada antes do apito, e Olivera acha Bueno sem maiores pretensões. Charly parte para cima de dois defensores. O primeiro cai após um corte seco - o Centenário levanta-se para observar esperançoso a última jogada - e o segundo perde na velocidade. Andújar sai do arco levantando tudo e todos, mas com um último toque, com o bico da chuteira, Bueno tira a pelota do alcance do arqueiro, que inapelavelmente o atropela. No último suspiro, penal para o Peñarol!

48' Antonio Pacheco ajeita a pelota com mais tensão do que carinho. Relembra as inacabáveis comparações que sofreu com Bengoechea. El Profe converteria aquele penalti com naturalidade. Ele, tremia. Mas chutou - o único lado inteiramente bom da cobrança é que ao menos o chute sempre sai - e com força o esférico encontrou os cordões do alto. Bem no meio. O Peñarol descontava, 2-1.

Segundo tempo:

01' O gol foi renovador, o ar ficou mais leve na fria noite de Montevideo. Los Pibes del Palacio, absurdamente bêbados, não acreditavam que após o fundo do poço estava a Copa Libertadores. Então cantavam. O que se viu e ouviu seria inesquecível. Um Centenário cantante do início ao fim das quatro tribunas. Os do Peñarol delirando. Os do Estudiantes não entraram no clima e entoaram ofensas ao pobre Gimnasia.

08' Ainda atrás no placar, mas passado o desespero, as chances de gol começavam a ficar mais naturais para os do Uruguai, que acumularam cinco escanteios nos primeiros minutos da segunda etapa.

12' Aterrorizado, Sensini chamou Maggiolo e o trocou por um volante. Trocou também a posse de bola pela catimba excessiva. O Estudiantes passou a cair mais do que jogar. Não daria para resistir a pressão do Peñarol, isso parecia claro.

19' Pode-se dizer que o carbonero descontou com a camisa, no final do primeiro tempo. Mas não era apenas um dos clubes da noite que possuíam um escudo tradicional e uma história imensa. Do outro lado, o Estudiantes não devia nada. E tinha Verón. E Alvarez, talvez também bêbado, o derrubou na meia-lua. Insano. Verón riu. Afastou com certa violência os companheiros que candidataram-se para a cobrança e, naturalmente, como se fizesse com as mãos, engavetou o terceiro gol. Golaço. 3-1 de visitante.

26' Desalento e uma tonelada nas costas, novamente. Como é sofrido ser do Peñarol. Mas desistir agora seria abdicar de uma glória imensa. E meio desacreditado, mas sem abandonar o confronto, o Peñarol buscou um empate distante.

30' Fernando "Petete" Correa adentrou a cancha no posto de Marcel Román. Três atacantes além de Olivera, sem posição definida no gramado neste segundo tempo. E foi dele, de Olivera, a cobrança rápida de falta que encontrou Correa atrás da zaga. Em frente ao goleiro, Petete acertou a trave em cheio.

36' A defesa dos leões de La Plata parecia mesmo intransponível. Um a um, os ofensivos carboneros perdiam a posse da pelota no campo de ataque. Sem qualquer inspiração, o contestadíssimo Maximiliano Arias inovou. Irritado com tantos passes barrados, embicou a bola da defesa na direção dos três atacantes. Franco pulou, e desviou por desviar, porque daquela pelota nada seria aproveitado. Mas o leve desvio do centroavante encontrou a gigantesca estrela de Bueno, que passou por cima de seu defensor e encontrou a pelota errante. Bueno, Andújar e uma bola picando. Não foi pensado, foi instinto: chapéu e finalização antes de picar. 3-2 sensacional.

39' O empate era real, era concreto. E era só o que a multidão queria. Em La Plata, dariam um jeito de vencer. Para as circunstâncias, 3-3 era, antes de épico, necessário. Em um dos tantos corners que voaram até a área visitante, Oscar Ruiz viu sobrar um soco. Os sessenta mil uruguaios juraram ver a agressão, berraram em uníssono. E ao consultar o bandeirinha, assustado com a pressão nas suas costas, Ruiz voltou com o vermelho na mão. Alayes expulso.

44' Vinte e oito centros desesperados, ao menos foi isso que a TV brasileira somou no segundo tempo. E no último minuto regulamentar, nova oportunidade de bola parada. Falta lateral, no meio do caminho entre a linha da grande área e a linha lateral. Pacheco na bola, sempre ele. O empate precisava chegar, e tinha que ser dali. Biglianti atravessou o campo, os onze aurinegros estavam no lance. Outros dizem que chegava a quase um milhão. O cruzamento saiu muito fechado, encontraria exatamente as luvas do arqueiro. Mas centímetros antes dele, Franco desviou, desta vez um desvio providencial. O esférico encobriu Andújar e chocou-se no travessão, sem força. Na volta, debaixo do arco, um perplexo Aguirregaray empurrou de barriga. 3-3 e dez minutos de comemoração. Oscar Ruiz distribuiu cartões, indignado, e nem deu acréscimos. Nem precisava. Para o Peñarol, o 3-3 foi vitória. Remontada. A América, inacreditavelmente, estava logo ali.

45' Fim do jogo.

Próxima quarta-feira: o segundo confronto da final.

Nenhum comentário: