segunda-feira, 25 de junho de 2007

Golaço de Sanfilippo

Futebol ao sol e à sombra é um brilhante livro do uruguaio Eduardo Galeano, um admirador do futebol e excepcional conhecedor da bola. Em seus livros sobram textos sensatos sobre o futebol do mundo todo, ano a ano, além de relatos de golaços, estratégias que mudaram um jogo, campanhas inesquecíveis, goleadores, craques e entusiastas do futebol.
Também estão presentes no livro textos de outros escritores da América Latina, como a carta do argentino Osvaldo Soriano sobre um mítico atacante do San Lorenzo de Almagro:

''Querido Eduardo:

Te conto que dia desses estive no supermercado "Carrefour", onde antigamente era o campo do San Lorenzo. Fui com José Sanfilippo, o herói da minha infância, que foi goleador do San Lorenzo quatro temporadas seguidas. Caminhamos entre as prateleiras, rodeadas de caçarolas, queijos e résteas de lingüiça. De repente, quando nos aproximamos das caixas, Sanfilippo abre os braços e me diz: "E pensar que bem daqui meti um gol de bate-pronto no Roma, naquela partida contra o Boca...". Passa diante de uma gorda que arrasta um carrinho cheio de latas, bifes e verduras, e diz: "Foi o gol mais rápido da história".

Concentrado, como esperando um córner, ele me conta: "Eu disse ao número cinco, que estreava: assim que começar a partida, manda a bola para a área. Não se preocupe, que não vou te deixar mal. Eu era mais velho e o rapaz, que se chamava Capdevilla, se assustou, pensou: se eu não obedecer, estou frito". E aí, de repente, Sanfilippo me mostra a pilha de vidros de maionese e grita: "Ele colocou a bola bem aqui!" As pessoas nos olham, assustadas.

"A bola caiu atrás dos zagueiros centrais, atropelei mas ela foi um pouco para lá, ali onde está o arroz, viu só? - e me mostra a estante de baixo, de repente corre como um coelho apesar do terno azul e dos sapatos lustrosos: "Deixei-a quicar, e plum!". Dispara com a esquerda. Nos viramos, todos, para olhar na direção da caixa, onde há trinta e tantos anos estava o gol, e parece a todos nós que a bola entra por cima, justamente onde estão as pilhas para rádio e as lâminas de barbear. Sanfilippo levanta os braços para festejar. Os fregueses e as caixas quase arrebentam as mãos de tanto aplaudir. Quase comecei a chorar. O Nene Sanfilippo tinha feito de novo aquele gol de 1962, só para que eu pudesse vê-lo.

Osvaldo Soriano''

José Sanfilippo marcou 283 gols na carreira, sendo 204 pelo clube do coração.
Jogando de 1953 até 1972, 'El Nene' passou também por Boca Juniors, Nacional de Montevidéo e Banfield.
Sanfilippo está na seleção histórica de seu clube, entre os onze imortais do San Lorenzo de Almagro.

Nenhum comentário: