domingo, 2 de agosto de 2009

Vileiros da minha América

Este texto não fará um panorama das condições de vida da parcela marginalizada da América Latina. A vila, citada já no título, é a que se ADONOU das manchestes esportivas do MUNDO neste domingo, cinzento e chuvoso de onde DIGITO, mas ensolarado em Montevideo. Falamos da Villa del Cerro, um dos bairros mais populosos da Capital uruguaia, cujos habitantes são os campeões da Liguilla uruguaia: o rival do Rampla Juniors, o dono do Luís Tróccoli, o que por puro TEMOR demora para ser NOMEADO pelos seus adversários, enfim, o valoroso Club Atlético Cerro.

Tem FAMA, o Cerro. Ao chegar em Montevideo e comentar sobre as partidas menores do campeonato, os moradores mais PREOCUPADOS com a SAÚDE do TURISTA logo atentam: todos os estádios de Montevideo são tranquilos, mas evite ir ao Cerro. São maus, os cerristas. Ou uma hinchada muy aguerrida, como explicou um taxista. Fato constatado é que o quadro celeste é o terceiro mais citado nas canções OFENSIVAS das barra-bravas. Tanto tricolores como carboneros orgulham-se de eventuais idas ao Tróccoli sem ESCOLTA POLICIAL. Isso fora de campo. JOGANDO FUTEBOL, o Cerro digamos que não seja tão temido – até esta tarde, não ostentava nenhum título na primeira divisão. E não se trata de uma CRISE recente: na Era Amadora, até o Rampla Juniors ergueu um caneco (em 1926), e o Cerro não.

Como VIVER sem jamais gritar um campeonato? O torcedor do Cerro, como todos os outros aficionados do planeta, também teve as suas noites de glória – que serviam, a cada recordação, como um INCENTIVO para AGUENTAR a existência. O Cerro comemorou, por exemplo, o título da Segunda Divisão em 1998, a participação na Copa Libertadores de 1995 e uma FEÉRICA surra (5-0) no rival de todos os dias, o Rampla, em 2006. Tudo muito efêmero, já que o clube voltou a ser rebaixado anos depois e venceu apenas uma partida naquela Libertadores (1-0 no Independiente, de Avellaneda, sete vezes campeão da América).

A fidelidade da torcida, porém, mantia-se intacta. Trata-se de um clube de bairro, um quadro dos arredores, mas tem os seus apaixonados, e isso é consenso em Montevideo. Quem é Cerro, é apenas Cerro. E em 2009, OITENTA E SEIS anos depois da fundação (um primeiro de dezembro cálido e chuvoso, como costumam ser todos os primeiros de dezembro), os villeros receberam o seu REGALO. O título da Liguilla recoloca o clube na Libertadores e, mais do que isso, valeu uma taça. Fui AGRACIADO pelos céus e pude ver o início de TUDO, em um domingo montevideano de julho. Na estreia da Liguilla, no mítico Centenário, o Cerro bateu o Nacional por 3-1 e CUTUCOU a minha atenção. Foram três mas poderiam ter sido bem mais. A NORMALIDADE com que os cerrenses enfileiraram um, dois, três tentos no Bolso soou-me ANORMAL. Como o espetáculo nas tribunas, já que os albicelestes cantaram mais alto – mesmo em menor número – durante todo o primeiro tempo. Ninguém sabia e poucos DESCONFIAVAM, mas ali estava o campeão.

Antes do início da última rodada, o Cerro já estava garantido na Copa Sul-Americana, destino do terceiro e do quarto colocado do torneio. Como liderava, garantia presença na maior das Copas com um empate. Recebeu o River Plate, que também lutava por um assento no maior EVENTO do TERCEIRO MUNDO, no Estádio Luís Franzini. Na Liguilla, os clubes duelam em campo neutro. Para o Cerro foi uma pena. Fosse o jogo no Troccóli, a festa seria ainda maior. Uma multidão teve de atravessar a cidade, da Villa ao Parque Rodó, para aplaudir Pellejero, Dadomo e Boghossian e sonhar em ser campeão. Fosse o jogo no Tróccoli, vinte mil cerrenses poderiam apoiar o onze mandando a campo por Eduardo Acevedo.

Quanto ao estádio, vale um CAUSO sobre a sua inauguração, em agosto de 1964. O ilustre convidado foi o River Plate portenho, que desembarcou no outro lado do Rio com nomes do PESO de Carrizo, Gatti, Matosas e Cubilla. O Cerro, orgulhoso e empolgado com o novo LAR, meteu INDECOROSOS 5-2, sendo que no intervalo o arqueiro Gatti, ao ser perguntado por um repórter RANDÔMICO se o River Plate faria algum cambio, respondeu que: “sairia Carrizo para a entrada do melhor goleiro do mundo.” A cancha, aliás, é a segunda maior de Montevideo (há quem conteste), e abriga quase 30 mil torcedores. Mas voltemos a Liguilla, carajos.

Na última de todas as jornadas, com ANOTAÇÕES de Dadomo, Boghossian e Matías Cabrera, os azuis superaram o River Plate de Juan Ramon Carrasco, que ameaçou até o PENÚLTIMO SUSPIRO. Penúltimo porque, quando faltavam dois minutos para o fim, os darseneros ainda alçavam desesperados centros para a área do Cerro, mas no minuto DERRADEIRO Diego Silva LARGOU DE MÃO, embicou um cerrense, observou um OPRESSOR cartão vermelho e NOTOU que a Libertadores não lhe PERTENCERIA. Para as batalhas continentais, o Cerro deve sofrer com algumas baixas. Boghossian, o centroavante que foi o artilheiro da Liguilla com sete gols, já acertou com o Newell's, da Argentina. O treinador Eduardo Acevedo pode assumir o Nacional, que perdeu Gerardo Pelusso. Mas hoje, nada disso importa. O Cerro é campeão pela primeira vez. Há que se descobrir como festejar um título.

***

A Liguilla, ao fim e ao cabo, teve esta classificação: 1) Cerro; 2) Racing; 3) River; 4) Liverpool e Defensor; 6) Nacional. Cerro e Racing se classificaram para a Libertadores, sendo que o segundo entra na chamada pré-Copa. O River Plate disputará a Sul-Americana, na qual estreia contra o boliviano Blooming, no dia onze de agosto. Liverpool e Defensor, que empataram em pontos, disputarão uma partida extra na próxima quarta-feira para definir qual será o segundo representante uruguaio na Sul-Americana. (Fotos minhas)

Um comentário:

Frederico disse...

Baita texto!!! Belíssima história... parabéns.

Força ao futebol do interior... ou aos clubes de menor expressão, mas tradicionais e com torcida.