A Holanda que hoje impressiona por suas políticas em relação a temas polêmicos como eutanásia, aborto, prostituição, drogas e direitos de homossexuais tem exemplos históricos de posicionamentos à frente dos tempos vividos. Durante os anos 1700, quando as questões religiosas eram mais espinhosas, a Igreja Reformada (calvinista) estava intimamente ligada ao Estado, mas nas regiões holandesas era permitida a coexistência de outras fés judaico-cristãs. Contudo, essa situação de tolerância multicultural não impediu o desenvolvimento de um nada louvável segregacionismo com o passar do tempo. Pelo fim do século XIX, originou-se, na sede do Reino dos Países Baixos, o sistema nomeado Pilarização (Verzuiling, em holandês).
Esse modo de organização, como o nome dá a entender, dividia a sociedade em “pilares” determinados de acordo com a religião ou ideologia dos cidadãos. Convencionalmente são considerados os três mais destacados, os pilares Protestante, Católico e Socialista, havendo um quarto grupo menor em tamanho e organização, formado principalmente por ateus e liberais de esquerda e direita. Os membros de cada pilar administravam seus próprios partidos políticos, órgãos de imprensa, centros de ensino, hospitais e, não poderiam faltar, clubes esportivos. Assim, o contato entre pessoas de um pilar e outro muitas vezes só se dava em nível governamental, através dos representantes dos partidos, sendo a separação mantida no cotidiano.
A partir do final da Segunda Guerra Mundial, porém, coincidindo com o advento da televisão (que, nos primeiros anos, fazia transmissões únicas para todos), a Pilarização decaiu. Grupos progressistas abriram um período de mobilidade e contato entre as partes isoladas e logo ganharam a adesão dos jovens, desinteressados em continuar aquela situação. A vida passou por mudanças e a política também, com partidos de pilares distintos se unindo significativamente durante os anos 1960 e 1970. Hoje, há somente alguns poucos reflexos daquela “segregação tolerante” holandesa – e aqui entramos no futebol.
O futebol amador, mais especificamente, pois na Holanda existem oito divisões não-profissionais: do terceiro nível nacional, a Hoofdklasse, ao décimo e último, a Zevende Klasse. Embora a primeira temporada da Hoofdklasse tenha sido disputada em 1974/75, quando a Pilarização já batia biela, o seu campeonato foi fracionado em chaves diferentes contendo os Clubes de Sábado e os Clubes de Domingo – os primeiros eram de protestantes, impedidos de jogar futebol aos domingos, enquanto os quadros dominicais eram de católicos, que não tinham restrições, ou de operários, cuja maioria dos jogadores precisava trabalhar aos sábados. Por menos sentido que faça sustentar essa separação, evitou-se reorganizar todo o sistema de ligas amadoras e não se efetuou mudança alguma – pelo contrário, cada nova divisão criada para baixo foi ganhando grupos distintos com jogos uns somente aos sábados e outros apenas aos domingos.
Para exemplo, fiquemos com a Hoofdklasse mesmo. Nela, há seis grupos de 14 equipes, três sabatinais e três dominicais – essa nova subdivisão dentro dos dias do fim de semana é regional, havendo uma chave diária para as equipes do oeste, outra para as do sul e centro, e a terceira contemplando as do norte e leste da Holanda. Ao mesmo tempo em que transforma a conquista do título máximo numa verdadeira epopéia, essa fórmula permite que um clube empilhe três taças na mesma temporada: os vencedores de cada região passam a triangulares para definir o Campeão Nacional do Sábado e o Campeão Nacional do Domingo e esses vencedores jogam entre si em partidas de ida e volta (neste ano, ambas disputadas em sábados), buscando definir, enfim, o Campeão Nacional Geral da divisão.
O clube amador mais bem-sucedido e de maior torcida da Holanda é o IJsselmeervogels (algo como pássaros do lago IJssel - ou Yssel, dependendo da grafia utilizada), da cidade de Spakenburg. Até a data, o seu palmarés conta com 29 taças do Grupo Centro-Sul/Sábado, 14 títulos Nacionais de Sábado e 5 títulos Nacionais Gerais, números que o botam na liderança de todas as listas de campeões da Hoofdklasse. Apesar do grande sucesso, o time, como vários outros amadores, quase nunca aparece – com exceção de algumas campanhas extraordinárias na Copa da Holanda (o IJsselmeervogels foi semifinalista em 1975), são raríssimas as oportunidades em que essas equipes encontram os grandes do país. Simplesmente porque as ligas profissionais, que englobam 38 agremiações, são fechadas – até este ano, o fluxo de rebaixamentos e acessos era entre a primeira e a segunda divisões, profissionais, e entre a terceira e décima, amadoras desligadas das duas de cima (novas equipes poderiam requisitar ingresso na segunda divisão, mas isso dependia muito mais de fatores econômicos do que dos resultados em campo).
Essa outra segregação, que nada tem a ver com a Pilarização, começa a ser derrubada exatamente em 2008/09. Para esta temporada, foi definido um projeto de rebaixamento e substituição do último colocado da Eerste Divisie (segunda divisão) pelo Campeão Nacional Geral da Hoofdklasse, desde que este aceite e cumpra os critérios estabelecidos pela Federação para ingressar numa liga profissional. O plano é que, já em 2009/10, um regulamento com mais garantias e vagas de acesso e rebaixamento esteja em vigor.
Esse modo de organização, como o nome dá a entender, dividia a sociedade em “pilares” determinados de acordo com a religião ou ideologia dos cidadãos. Convencionalmente são considerados os três mais destacados, os pilares Protestante, Católico e Socialista, havendo um quarto grupo menor em tamanho e organização, formado principalmente por ateus e liberais de esquerda e direita. Os membros de cada pilar administravam seus próprios partidos políticos, órgãos de imprensa, centros de ensino, hospitais e, não poderiam faltar, clubes esportivos. Assim, o contato entre pessoas de um pilar e outro muitas vezes só se dava em nível governamental, através dos representantes dos partidos, sendo a separação mantida no cotidiano.
A partir do final da Segunda Guerra Mundial, porém, coincidindo com o advento da televisão (que, nos primeiros anos, fazia transmissões únicas para todos), a Pilarização decaiu. Grupos progressistas abriram um período de mobilidade e contato entre as partes isoladas e logo ganharam a adesão dos jovens, desinteressados em continuar aquela situação. A vida passou por mudanças e a política também, com partidos de pilares distintos se unindo significativamente durante os anos 1960 e 1970. Hoje, há somente alguns poucos reflexos daquela “segregação tolerante” holandesa – e aqui entramos no futebol.
O futebol amador, mais especificamente, pois na Holanda existem oito divisões não-profissionais: do terceiro nível nacional, a Hoofdklasse, ao décimo e último, a Zevende Klasse. Embora a primeira temporada da Hoofdklasse tenha sido disputada em 1974/75, quando a Pilarização já batia biela, o seu campeonato foi fracionado em chaves diferentes contendo os Clubes de Sábado e os Clubes de Domingo – os primeiros eram de protestantes, impedidos de jogar futebol aos domingos, enquanto os quadros dominicais eram de católicos, que não tinham restrições, ou de operários, cuja maioria dos jogadores precisava trabalhar aos sábados. Por menos sentido que faça sustentar essa separação, evitou-se reorganizar todo o sistema de ligas amadoras e não se efetuou mudança alguma – pelo contrário, cada nova divisão criada para baixo foi ganhando grupos distintos com jogos uns somente aos sábados e outros apenas aos domingos.
Para exemplo, fiquemos com a Hoofdklasse mesmo. Nela, há seis grupos de 14 equipes, três sabatinais e três dominicais – essa nova subdivisão dentro dos dias do fim de semana é regional, havendo uma chave diária para as equipes do oeste, outra para as do sul e centro, e a terceira contemplando as do norte e leste da Holanda. Ao mesmo tempo em que transforma a conquista do título máximo numa verdadeira epopéia, essa fórmula permite que um clube empilhe três taças na mesma temporada: os vencedores de cada região passam a triangulares para definir o Campeão Nacional do Sábado e o Campeão Nacional do Domingo e esses vencedores jogam entre si em partidas de ida e volta (neste ano, ambas disputadas em sábados), buscando definir, enfim, o Campeão Nacional Geral da divisão.
O clube amador mais bem-sucedido e de maior torcida da Holanda é o IJsselmeervogels (algo como pássaros do lago IJssel - ou Yssel, dependendo da grafia utilizada), da cidade de Spakenburg. Até a data, o seu palmarés conta com 29 taças do Grupo Centro-Sul/Sábado, 14 títulos Nacionais de Sábado e 5 títulos Nacionais Gerais, números que o botam na liderança de todas as listas de campeões da Hoofdklasse. Apesar do grande sucesso, o time, como vários outros amadores, quase nunca aparece – com exceção de algumas campanhas extraordinárias na Copa da Holanda (o IJsselmeervogels foi semifinalista em 1975), são raríssimas as oportunidades em que essas equipes encontram os grandes do país. Simplesmente porque as ligas profissionais, que englobam 38 agremiações, são fechadas – até este ano, o fluxo de rebaixamentos e acessos era entre a primeira e a segunda divisões, profissionais, e entre a terceira e décima, amadoras desligadas das duas de cima (novas equipes poderiam requisitar ingresso na segunda divisão, mas isso dependia muito mais de fatores econômicos do que dos resultados em campo).
Essa outra segregação, que nada tem a ver com a Pilarização, começa a ser derrubada exatamente em 2008/09. Para esta temporada, foi definido um projeto de rebaixamento e substituição do último colocado da Eerste Divisie (segunda divisão) pelo Campeão Nacional Geral da Hoofdklasse, desde que este aceite e cumpra os critérios estabelecidos pela Federação para ingressar numa liga profissional. O plano é que, já em 2009/10, um regulamento com mais garantias e vagas de acesso e rebaixamento esteja em vigor.
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