PORTO ALEGRE – Há uma reflexão jocosa que diz, aos tranquilos, que, se todos ao seu redor estão desesperados e eles permanecem sem se preocupar, é porque não compreenderam a gravidade da situação. Ontem eu me sentia, de leve, um desses tranquilos alienados, enquanto saía do litoral na direção de Porto Alegre por uma Estrada do Mar superlotada e caótica (foto).
Milhares de carros tomavam a estrada. O céu mandava um temporal. Um engarrafamento arrastava o tráfego. Estradas desabavam em alguns pontos. Pessoas não queriam nem saber e passavam por entre a terra e a água. “Precisamos voltar a Porto Alegre”, deviam gritar elas de dentro dos seus automóveis, desesperadas. Se ficasse um pouco mais naquela fila quilométrica, provavelmente veria cabeças rolando pelo acostamento, carros em chamas, homens duelando com tacapes e viúvas gritando loucamente por seus maridos.
Mais do que fugir de um tempo que frustrou o fim de semana na praia, os portoalegrenses* e mesmo nativos de outras cidades queriam chegar à capital de qualquer maneira antes do domingo porque hoje começava a maratona de quatro dias de provas do vestibular da urgues. Concorrendo entre 34,5 mil inscritos, ser eliminado por não estar no local de avaliação a tempo era a última coisa que queriam os infelizes que buzinavam a esmo na rodovia. Para mim, que optara há semanas por virar estatística de abstenção, restava a indiferença dos alienados.
A fila de automóveis da Estrada do Mar já avançava feito lesma às três da tarde, quando saí dela e entrei na friuêi, a autoestrada que àquele momento tinha um trânsito de 65 carros por minuto. A situação complicou mesmo minutos depois, quando a chuvarada abriu uma cratera na BR-101, tornando-a intransitável, e todos os que retornavam de Santa Catarina foram desviados para a Estrada do Mar. Outros trechos catarinenses, aliás, enfrentavam problemas com o clima, alguns deles com até meio metro de água sobre o asfalto, forçando a polícia a limitar o trânsito a um carro por vez em certo momento.
O trajeto Torres-Porto Alegre, normalmente vencido em noventa minutos, eu completei em quase quatro horas. Mas houve quem passasse mais, muito mais tempo na estrada, vendo o relógio andar sem que os quilômetros evoluíssem em ritmo parecido. Dos muitos que saíram das praias na tarde de sábado, por causa do vestibular, houve alguns que, absurdo, passaram a noite na estrada e não conseguiram chegar a Porto Alegre antes do início das provas. Entrar na urgues, que já era difícil, ficou impossível para estes por pelo menos mais um ano.
Um desastroso desperdício para quem passou meses estudando. De chorar. Muito. Mas podia ser pior. Pelo menos eles não se chamam Sthanner Klinsmann da Silva, como o guri de pais maldosamente criativos que joga a Copa São Paulo pela União Barbarense.
2 comentários:
* Não tenho a menor ideia de como se escreve isso após a estúpida reforma ortográfica que vigora desde o dia primeiro. Pela regra, vogais diferentes separadas por hífen (como era porto-alegrense) agora são escritas juntas. Não sei se o gentílico será uma exceção, se há uma regra oculta que desconheço, ou ainda se ele é um dos que prassará pela definição da ABL, mas fica a observação, como registro.
A Zero Hora, que já adotou os regulamentos do acordo, segue escrevendo porto-alegrense.
Que ridículo não ser capaz de definir o que é certo na minha própria língua.
Essa chuva maldita estragou o fim de semana de muitos, eu, que estava acampando, ia ficar uma semana, tive que voltar no 3º dia
E quero ver as pessoas se adequarem a essa reforma ortográfica
Postar um comentário