Hoje faz vintecinco anos que Hugo de León mandou o Peñarol plantar batatas. Como um metafórico troféu da batalha que acabara de ser travada, enquanto dava a entrevista, um filete de sangue escorria pela testa do grande capitão uruguaio ex-Nacional, vencedor do seu clássico particular no estádio Olímpico e bêbado por derrotar os aurinegros com uma camisa tricolor diferente daquela que o revelara. Por dois a um, o Grêmio de De León, de Mazarópi, de Paulo Roberto, de Baidek, de Casemiro, de China, de Osvaldo, de Caio, de China, de Renato Portaluppi, de Tarciso, de Tita e, por supuesto, de César, o reserva autor do gol do título, derrubava o gigante de Montevidéu, flamante campeão mundial do ano anterior, para, além de mirar, tocar na Copa. E erguê-la.
Pediram que acreditassem, disseram que acreditassem, nunca deixaram de acreditar que o Grêmio seria campeão da América naquela noite, em Porto Alegre, diante de 80 mil espectadores no estádio, outros milhões com ouvidos no rádio e olhos na tevê. Sustentar a esperança foi tarefa das mais complicadas. O quase carrinho de Caio para abrir o placar aos 10 minutos teve um epílogo de faltas, investidas perigosas e cada vez mais pressão oriental. Do outro lado rugia um poderoso então com quatro Libertadores no armário. Aqui, havia um jovem de três cores tentando construir tradição – um time recém-saído de uma década traumática e campeão nacional pela primeira vez dois anos antes, em 1981.
No minuto 70, o copero “insuperável” empatou, em cabeçada do letal Morena. Eram fortes demais, mesmo. O 1-1 repetia o placar da ida, no Centenário, e forçava um terceiro jogo em Buenos Aires, distante daquela torcida que insistia em acreditar.
Os que viveram aquela noite dizem não ter havido até ali minutos mais tensos que os posteriores ao empate do Peñarol. Uma chance extraordinária, quiçá irrepetível, indo embora. E na sua casa! Era o desperdício da noite para entrar no seleto grupo de reis de todo um continente, ao qual só acediam os merecedores.
Os que viveram aquela noite dizem não ter havido até ali minutos de maior cantoria que os posteriores ao empate do Peñarol. Porque a torcida percebeu estar em sua voz a chance de mudar para sempre o rumo da história. Renato, o predestinado, também teve a percepção de que estava em seus pés o impulsor para que todo o gremismo atingisse o ápice das maiores conquistas. Preso à linha lateral, numa jogada que só os gênios – ou os loucos – podem arquitetar, ergueu a bola no ar e, sem deixá-la cair, deu um novo golpe para cruzar à área. César, em campo para substituir Caio havia pouco, apareceu no outro lado da área dando um peixinho sem medo de destroçar a cabeça na trave. Fernández, o goleiro, reagiu tarde demais.
Os que viveram aquela noite dizem não lembrar direito o que aconteceu em campo depois do 2-1 anotado aos 77 minutos. Estavam com os olhos cheios de lágrimas, a garganta dolorida, a cabeça nas nuvens, as mãos no céu, como que puxando as estrelas de lá para levá-las à camisa azul, negra e branca. Sabiam que nada mais tiraria o título inédito do Grêmio e, com a pouca força de voz que restava, berravam: nós somos campeões da América!
28 de julho de 1983, a data em que o Grêmio se fez grande para sempre.
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Depoimentos dos personagens, no livro Até a Pé Nós Iremos, de Ruy Carlos Ostermann:
• Fábio Koff (presidente), China e Paulo Roberto
• Valdyr Espinosa (treinador), Renato, Tonho e Alberto Galia (vice de futebol)
• Fábio Koff (presidente), China e Paulo Roberto
• Valdyr Espinosa (treinador), Renato, Tonho e Alberto Galia (vice de futebol)
Um comentário:
Mauricio, parabéns pela lembrança. O de Leon levantou a taça sangrando! Sensacional!
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