
Nada disso traduz o significado da noite de quarta-feira melhor do que analisar o confronto focando Luiz Alberto (na foto à direita, disputando a bola). Ele, o capitão tricolor, um jogador defensivo firme, embora com futebol longe do genial. Um raro homem com a capacidade de compreender plenamente o seu posto como parte da história e seu poder de transformá-la. Luiz Alberto foi emblemático na campanha pela América em 2008. Nas suas entrevistas, nã

Mais que um mero frasista, um orador. Não foi dada a devida relevância à grandeza das palavras ditas por Luiz Alberto, mas elas teciam uma imagem de fundo perfeita para o momento que se vivia. Como anunciava o capitão, o Flu se fez grande como nunca antes. Eliminou São Paulo. Passou por cima do Boca. Mesmo sofrendo a desvantagem na final contra a LDU, permaneceram as mensagens de esperança para que os cariocas pensassem ao estilo sí, se puede. Nem com os 4-2 levados na ida e o 0-1 sofrido no início do jogo de ontem, deixando o placar agregado quase irrecuperável, aquela fé cessou. O que Luiz Alberto falava não era um sentimento apenas próprio, e sim de toda a torcida do Fluminense – como, supõe-se, era também dos aficionados da Liga de Quito. A grandeza de seu discurso estava nisso, na perfeita sincronia de pensamento entre time e torcida, uma vontade que vinha do fundo da alma de cada um cujas emoções dependiam diretamente do que ocorria no Maracanã. Ao intervalo, 2-1 favorável no placar, o líder dos grenás, verdes e brancos levantaria seus torcedores uma vez mais.
O título estava perto. A poucos gols de distância. Raça e qualidade fariam ele vir. E isso, prometia, não faltaria: sairia o terceiro gol, e depois o quarto. Tinha que sair. Hat-trick de Thiago Neves e o terceiro saiu. O 3-1 levou o duelo a uma prorrogação em que os números de oportunidades se modificariam pouco, aumentando o abismo até o quarto tento. Teríamos os erros de arbitragem, não concedendo um pênalti ao Flu ainda no tempo normal, anulando um gol legítimo da Liga na meia hora extra, mas a cara do jogo nos tempos finais foi de cansaço e temor de cometer erros fatais. Parecia inalterável aquele quadro quando, aos 119 minutos, puxando um fôlego e uma arrancada digna de quem merece sonhar com a grande Copa, Guerrón partiu do centro do campo rumo à área carioca, vencendo marcadores, aproximando-se do gol iminente.
Pouco antes da linha da área, levou a pancada e caiu numa falta que não renderia gol. Luiz Alberto estava lá como recurso final, último zagueiro, parando tudo e saindo expulso. Na beira do gramado, onde permaneceria irregularmente durante toda a tanda de pênaltis, o capitão justificava sua escolha. Sua falta era quase um gol do título. Como um guerreiro caído em batalha, sacrificava-se em prol do objetivo comum. Ao custo de sua permanência sobre o terreno de jogo, impedia que suas redes fossem balançadas naquele momento definitivo. Dizia isso sorrindo. Aparentava vislumbrar a situação como perfeita para a glória. A partir dos chutes vindos da marca de onze metros, a Copa sairia do Maracanã para as Laranjeiras. O cenário estava montado. Ele, confiante. Seriam heróis eternos.
Por ora, com o campeão indefinido, todos podiam se dizer heróis por haver chegado até ali. Dos vinte jogadores que continuariam no verde (com a expulsão do outro lado, a Liga também teria que sacar um para os penais), somente um podia ser tomado por anti-herói. “Pepe Pancho” Cevallos, o goleiro de braços curtos e pulos atrasados. Durante o tempo corrido, falhou espetacularmente em bolas relativamente fáceis, incluindo o primeiro gol, sofrido por mau posicionamento. Saiu como o homem da noite. Vice-campeão da América há uma década, 37 anos nas costas, Cevallos sabia ser aquela a sua provável última chance de lograr o maior dos títulos que um atleta de clube pode querer. Agachado, de costas para o batedor, agarrado às redes num ritual particular, rezava. Dizia fazer pedidos para a Virgem Milagrosa da qual era devoto, apesar de não estar errado aquele que interpretou como uma prece aos nem sempre piedosos deuses do futebol. Pois eles sorriram diante da catimba e premiaram o arqueiro equatoriano com a fortuna. Cevallos defendeu três tiros.
Inverteu o placar do jogo. Nos pênaltis, 3-1 para a Liga de Quito, grande campeã da Libertadores 2008.

Um comentário:
Cevallos, Ducadam e alma de Libertadores
Se me pedissem para apontar um jogador dessa final, sem dúvida eu escolheria Cevallos. Toda sua experiência, aliada à catimba foi sensacional. É disso que se trata a Libertadores. Nos últimos anos, a alma vêm sendo deixada de lado, e são poucos os jogos "pegados" que se vêem, nem comparação com o que era há alguns anos, talvez esse, aliado a mais outros fatores, seja o principal catalizador para a chegada de mais clubes brasileiros nas finais. Escolheria Cevallos sem dúvida, mesmo antes da cobrança de penais.
Mas como o título se decidiu na marca da cal, foi inevitável...quando Conca perdeu o pênalti, defendido por Cevallos, na hora, me veio a lembrança de DUCADAM, na final da Copa dos Campeões de 86, foi como uma visão...e olha que eu nem sabia que o arqueiro acabaria defendendo 3 pênaltis, mas o lado do gol, a jaqueta verde, tudo me fez remeter ao goleiro do Steaua Bucaresti, a semelhança só não foi maior pois o romeno defendeu 4 cobranças. Mesmo assim, presenciamos um momento histórico. Merecida conquista.
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