sexta-feira, 4 de julho de 2008

As ‘n’ tragédias e algumas vitórias

Retrato do genuíno Maracanazo

O Maracanã nasceu desgraçado. Construído para a Copa do Mundo de 1950, rendeu, em seus primeiros meses, a mais dolorosa tragédia do futebol brasileiro. Ao ver o time da casa perder para o Uruguai de Ghiggia, fez nascer uma palavra eterna: Maracanazo. Ela se banalizou. Hoje, qualquer time mais desacreditado que vença uma partida importante no outrora maior estádio do mundo merece que seu feito seja referenciado como um hijo daquele da Celeste.

A comparação e mesmo o termo “tragédia” soam exagerados, mas não se nega: o Maracanã é um dos palcos mais propícios para os times locais sofrerem retumbantes fracassos. O do Fluminense, terminado na madrugada de quinta-feira, é apenas o mais recente de um histórico vasto. A seguir, o Futebesteirol traz uma lista de todas as finais de campeonatos importantes disputadas no Maracanã pela Seleção Brasileira, equipes do país diante de estrangeiros, ou mesmo clubes cariocas, no caso de decisões nacionais. São considerados, portanto, jogos de volta de finais, partidas únicas, partidas de desempate ou a última rodada de um grupo que fosse confronto direto pelo título – desconsideram-se encontros entre cariocas.

As vitórias que renderam taças aos locais não são poucas, mas compõem uma minoria insuficiente para criar uma mística favorável ao estádio.

* * *

16/07/1950- Copa do Mundo, última rodada do quadrangular final
BRASIL 1-2 URUGUAI
Gols: 47’ Friaça (B); 66’ Schiaffino (U); 79’ Ghiggia (U)
Do jogo: na única Copa do Mundo em que a fase final foi um quadrangular (os outros times eram Espanha e Suécia), o Brasil chegava à última rodada podendo empatar com os orientais para erguer a Jules Rimet com um ponto de vantagem. Friaça abriu a contagem, mas os mais de 200 mil espectadores presenciariam uma remontada que deixou fantasmas eternos no inconsciente coletivo brasileiro. Foi a segunda e a última taça mundial do Uruguai.
TRAGÉDIA

02/04/1963- Taça Brasil (de 1962), terceiro jogo da final
BOTAFOGO 0-5 SANTOS
Gols: 24’ Dorval (S); 39’ Pepe (S); 54’ Coutinho (S); 75’ Pelé (S); 80’ Pelé (S)
Do jogo: o Santos vencera por 4-3 no Pacaembu e levara 3-1 na segunda partida, o que provocava um desempate, pela ausência de saldo de gols como critério para definir campeão. Entrou em campo, então, a qualidade imparável de um time que ficou famoso pelas goleadas que fazia, e de nada adiantou ao Botafogo ter jogadores como o goleiro Manga, Nilton Santos, Amarildo, Zagallo e Garrincha: foi um baile. E o segundo título de uma série de cinco erguidos pelo Santos na extinta Taça Brasil. Por uma daquelas falhas de organizações típicas do antigo futebol brasileiro, essa decidida em 1963 era a edição de 1962. (na foto ao lado, tirada antes da partida começar, Garrincha e Pelé trocam faixas referentes aos títulos estaduais do ano anterior)
TRAGÉDIA

16/11/1963- Mundial de Clubes (C. Intercontinental), terceiro jogo da final
SANTOS 1-0 MILAN (ITA)
Gol: 31’ Dalmo (S)
Do jogo: depois de levar 4-2 na Itália e vencer pelo mesmo placar no Maracanã, sua segunda casa, o Santos teve que ir para o confronto de desempate defender o título que conquistara um ano antes. Sem Pelé, desfalque por lesão, o time saiu do Rio de Janeiro bicampeão graças a um gol de pênalti.
VITÓRIA

19/12/1964- Taça Brasil, segundo jogo da final
FLAMENGO 0-0 SANTOS
Do jogo: foi zero a zero e não precisava ser mais. Na ida, jogada no Pacaembu, o Santos atropelou os inofensivos cariocas com um 4-1, placar que valeria seu tetracampeonato na Taça.
TRAGÉDIA

08/12/1965- Taça Brasil, segundo jogo da final
VASCO DA GAMA 0-1 SANTOS
Gol: Pelé
Do jogo: era covardia botar algum time para jogar contra o Santos por aqueles tempos. A de 1965 foi a quinta e última Taça Brasil erguida pelo Peixe no maior período de dominação da história do futebol brasileiro. O Vasco que caiu por esse 0-1 no Maracanã já havia sofrido 5-1 no Pacaembu, pela primeira partida decisiva, uma semana antes.
TRAGÉDIA

04/10/1969- Taça Brasil (de 1968), segundo jogo da final
BOTAFOGO 4-0 FORTALEZA
Gols: 7’ Roberto (B); 53’ Ferreti (B); 65’ Afonsinho (B); 83’ Ferreti (B)
Do jogo: final com carioca era final com a segunda partida no Maracanã, por motivos obscuros. O Botafogo, classificado nas fases anteriores após um polêmico WO concedido pelo Metropol de Criciúma, não teve problemas para empatar por 2-2 no Ceará e passar por cima do Fortaleza dentro do Maracanã. A edição ser de 1968 e estar sendo definida no décimo mês de 1969 era uma mostra explícita da decadência que vivia a Taça Brasil: o melancólico público da finalíssima, míseros 34.588 pagantes, assistiu à última partida da história do torneio, que não mais seria disputado.
VITÓRIA

19/12/1971- Campeonato Brasileiro, última rodada do triangular final
BOTAFOGO 0-1 ATLÉTICO MINEIRO
Gol: 63’ Dario (A)
Do jogo: o triangular decisivo tinha turno único. Na estréia, o Galo fizera 1-0 sobre o São Paulo, enquanto os paulistas devolveram no seu jogo seguinte, fazendo 4-1 no Botafogo. Os cariocas tinham a opção de golear para tentar ficar com o título ou de vencer para quiçá evitar uma conquista atleticana. Perderam. (à esquerda, o Galo campeão)
TRAGÉDIA

01/08/1974- Campeonato Brasileiro, partida de desempate do quadrangular final
VASCO DA GAMA 2-1 CRUZEIRO
Gols: 14’ Ademir (V); 19’ Nelinho (C); 78’ Jorginho Carvoeiro (V)
Do jogo: um escândalo. O regulamento previa um quadrangular final, ao qual se classificaram, além dos dois acima, o Santos e o Internacional. Cruzeiro e Vasco terminaram empatados em pontos na liderança, forçando uma partida de desempate entre eles – a ser disputada no Mineirão, casa do time com melhor campanha no geral. Alegando falta de segurança para uma partida em Belo Horizonte, os cariocas conseguiram levar o embate para o Maracanã (!!!), de onde saíram campeões.
VITÓRIA

01/06/1980- Campeonato Brasileiro, segundo jogo da final
FLAMENGO 3-2 ATLÉTICO MINEIRO
Gols: 7’ Nunes (F); 8’ Reinaldo (A); 44’ Zico (F); 66’ Reinaldo (A); 82’ Nunes (F)
Do jogo: Reinaldo (foto à direita) quase foi o herói do título. Machucado, entrou em campo para marcar doblete e empatar duas vezes o confronto. Aí, com o 2-2 que daria o título ao seu time no placar, reclamou de um impedimento inexistente marcado contra o Atlético e saiu expulso, numa decisão reclamada até hoje pelos torcedores mineiros. Éder e Chicão também veriam o vermelho, deixando o Galo com apenas oito atletas. Em vantagem numérica, o Fla foi para cima e conquistou, diante de 155 mil espectadores, seu primeiro título.
VITÓRIA

29/05/1983- Campeonato Brasileiro, segunda partida da final
FLAMENGO 3-0 SANTOS
Gols: 1’ Zico (F); 39’ Leandro (F); 69’ Adílio (F)
Do jogo: derrotado por 2-1 no Morumbi, pelo primeiro confronto, o Flamengo começou a remontar logo no início da partida de volta, em casa. Virou baile, e os rubro-negros terminaram com o terceiro Brasileirão conquistado num espaço de quatro temporadas (1980, 1982 e 1983).
VITÓRIA

31/07/1985- Campeonato Brasileiro, jogo único da final
BANGU 1-1 CORITIBA [5-6]
Gols: 25’ Índio (C); 35’ Lulinha (B)
Do jogo: um dos regulamentos mais confusos de todos os Campeonatos Brasileiros permitiu ao Coritiba chegar na final e ser campeão com um saldo de gols negativo: -2. O Bangu, vindo de chaves mais fáceis, teve melhor campanha e levou para a sua casa a partida única que valia o título. Clube menor, uniu ao seu redor as grandes torcidas do Rio, mas foi derrotado nos pênaltis (formato de desempate inédito até ali em finais do Brasileirão).
TRAGÉDIA

13/12/1987- Copa União, segunda partida da final
FLAMENGO 1-0 INTERNACIONAL
Gol: 16’ Bebeto (F)
Do jogo: após levar de Porto Alegre um 1-1, o Flamengo foi outra vez triunfante no Maracanã. Conquistou a Copa União. E só. Oficiosamente, o jogo valeu o título do Campeonato Brasileiro daquele ano, segundo a grande mídia, parte da opinião pública e o Clube dos 13. Oficialmente, foi apenas um dos grupos do Brasileirão de fato, cujo título é do Sport, pelo desrespeito ao regulamento da CBF por parte de Fla e Inter (que deveriam jogar um quadrangular pelo troféu ao lado dos pernambucanos e do Guarani de Campinas, os dois melhores do Módulo Amarelo, mas se recusaram).
VITÓRIA

16/07/1989- Copa América, última rodada do quadrangular final
BRASIL 1-0 URUGUAI
Gol: 49’ Romário (B)
Do jogo: todo o quadrangular decisivo da Copa América foi disputado no Maracanã. Argentina e Paraguai foram pífios, enquanto brasileiros e uruguaios chegavam à última rodada com campanhas rigorosamente iguais: duas vitórias, cinco gols feitos e nenhum sofrido. Exatos 39 anos depois do verdadeiro Maracanazo, os auriverdes se veriam triunfantes diante de um Uruguai que contava com nomes como De León, Ostolaza, Rubén Paz e Francescoli.
VITÓRIA

29/09/1993- Copa Conmebol, segundo jogo da final
BOTAFOGO 2-2 PEÑAROL (URU) [3-1]
Gols: Eliel, Sinval (B); Perdomo, Otero (P)
Do jogo: o Botafogo atuou num bizarro 4-2-4, saiu perdendo, virou, e sofreu no fim o empate que forçava pênaltis – no Uruguai, havia sido 1-1. Desde os onze metros, os cariocas não tiveram o mesmo azar do tempo normal, levantando sua única taça internacional oficial até hoje (na foto, a vibração após a confirmação do triunfo). Antes do jogo com o carbonero, a campanha teve classificações sobre Bragantino, Caracas e Atlético Mineiro. Sinval foi o artilheiro da competição, com oito gols.
VITÓRIA

06/12/1995- Supercopa da Libertadores, segundo jogo da final
FLAMENGO 1-0 INDEPENDIENTE (ARG)
Do jogo: em 1993, o Fla havia perdido uma Supercopa para o São Paulo, fora de casa. Dois anos depois, atingiu outra decisão, venceu mas... não levou a taça. O resultado do Maracanã foi insuficiente para remontar os 2-0 feitos pelo Independiente, e o clube argentino saiu de campo com o segundo título consecutivo no torneio.
TRAGÉDIA

22/05/1997- Copa do Brasil, segundo jogo da final
FLAMENGO 2-2 GRÊMIO
Gols: 6’ João Antônio (G); 30’ Lúcio (F); 41’ Romário (F); 79’ Carlos Miguel (G)
Do jogo: o gol qualificado resultou ao Grêmio o seu terceiro título da Copa do Brasil até então (já havia vencido em 1989 e 1994). Um empate por 0-0 em casa fez com que o gol de Carlos Miguel, no fim da partida de volta, fosse mais que a repetição de uma igualdade no agregado – representou uma vitória. (à esquerda, capa da Zero Hora de 24/05/1997, saudando o retorno dos campeões)
TRAGÉDIA

21/12/1997- Campeonato Brasileiro, segundo jogo da final
VASCO DA GAMA 0-0 PALMEIRAS
Do jogo: numa temporada em que Edmundo acabou com todo e qualquer adversário que cruzasse o caminho do Vasco, os cruzmaltinos fizeram a melhor campanha do Brasileiro desde a primeira fase. Na final, com o regulamento embaixo do braço, empataram por 0-0 fora e em casa para erguer a taça.
VITÓRIA

27/06/1999- Copa do Brasil, segundo jogo da final
BOTAFOGO 0-0 JUVENTUDE
Do jogo: inflado por uma parceria com a Parmalat, o Juventude, da serra gaúcha, deixou de ser mais um interiorano pequeno para tentar as maiores conquistas nacionais. Foi ao grande palco do Rio e de lá levou sua Copa, com um placar nulo. Em casa, fizera 2-1. Não se apostava um tostão furado nos de Caxias do Sul... como não se apostaria pelo Santo André, na década seguinte.
TRAGÉDIA

14/01/2000- Mundial de Clubes (FIFA), jogo único
VASCO DA GAMA 0-0 CORINTHIANS [3-4]
Do jogo: a louca fórmula do primeiro Mundial organizado pela FIFA e sediado no Brasil proporcionou uma final local. E foi o Corinthians, sem título internacional algum (o convite se dera por ser campeão nacional do país anfitrião), quem acabou ficando com a taça. O empate sem gols no Maracanã foi desfeito desde a marca penal, e a conquista dos paulistas sobre os cariocas se confirmou quando Edmundo mandou para fora os sonhos vascaínos.
TRAGÉDIA

18/01/2001- Copa João Havelange (de 2000), segundo jogo da final
VASCO DA GAMA 3-1 SÃO CAETANO
Gols: 30’ Juninho Pernambucano (V); 37’ Adãozinho (S); 40’ Jorginho Paulista (V); 52’ Romário (V)
Do jogo: um dos campeonatos mais simbólicos da desorganização que reinou no futebol brasileiro do século passado, a Copa João Havelange (torneio que substituiu o Campeonato Brasileiro após a CBF ser impedida, na justiça, de realizá-lo para o ano 2000) não poderia ter um final mais coerente. O jogo nunca deveria ter sido no Maracanã, e tampouco em janeiro de 2001. Era um 30 de dezembro quando o Vasco e o improvável São Caetano (então um surpreendente desconhecido que saíra do módulo equivalente à segunda divisão) entraram no gramado de São Januário para decidir o torneio... o Azulão jogava melhor até os 23 minutos do primeiro tempo, quando a queda de um alambrado do estádio interrompeu a partida. O saldo foi de 168 feridos e uma final adiada para janeiro. No duelo remarcado, agora no Maracanã, o Vasco não teve problemas para conquistar o título que posteriormente seria homologado como o Brasileiro daquele ano.
VITÓRIA

30/07/2004- Copa do Brasil, segundo jogo da final
FLAMENGO 0-2 SANTO ANDRÉ
Gols: 7’ Sandro Gaúcho (S); 67’ Elvis (S)
Do jogo: a mais impossível das tragédias do Maracanã. Na temporada anterior, o grande feito do Santo André tinha sido um vice-campeonato... da Série C. O time era apenas mais um daqueles com vida um pouco mais longa no torneio, e logo logo cairia, pensavam muitos. Mas as fases foram passando e nada do Santo André cair. Primeiro, classificação sobre o Novo Horizonte-GO, depois, abruptas vitórias sobre times como o Atlético Mineiro, o Guarani de Campinas e o Palmeiras. As semifinais foram um encontro de zebras: Santo André e o 15 de Novembro de Campo Bom, do Rio Grande do Sul, que nem a Série C disputava. Depois de estar levando 1-4 dentro de casa, os andreenses reagiram: perderam aquele jogo por 3-4, venceram a volta por 1-3, em solo gaúcho, e avançaram à decisão. Empataram a ida da final por 2-2, em casa, deixando o Fla ser campeão quando entrasse em campo para a volta no Rio: bastava empatar sem gols. Só houve silêncios naquela noite da volta. Atônito, o Maracanã assistiu a um 0-1 marcado muito cedo, com a tragédia sendo dobrada pelo tento de Elvis (foto), na etapa complementar. O gigante Flamengo era completamente dominado por um desprezado que surgiu em 2004 para o vôo mais alto de toda a sua existência.
TRAGÉDIA

02/07/2008- Libertadores, segundo jogo da final
FLUMINENSE 3-1 LIGA DE QUITO (EQU) [1-3]
Gols: 5’ Bolaños (L); 11’ Thiago Neves (F); 27’ Thiago Neves (F); 56’ Thiago Neves (F)
Do jogo: aquilo que já se sabe.
TRAGÉDIA

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Saldo final:
Maracanazos12-10 Vitórias.

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