quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Fagulhas dezembrinas

Num bolicho na beira de uma estrada de terra, um menino duns onze anos tomava Coca-Cola no canudinho. Garrafa média, de vidro. Solito e entediado, mascava o plástico e se divertia em afinar os dutos inicialmente cilíndricos usando os dentes frontais de cima e de baixo.

Numa farmácia do centro da cidade, um Papai Noel de menos de trinta anos, barba branca postiça, empapava de suor as vestes rubras. Olhos escondidos atrás de óculos negros. Assustava as crianças com seu aspecto cansado, mas persistia em balançar um sino e oferecer-lhes balas.

Numa praia de mar achocolatado, meia dúzia de adolescentes revivia a infância na espuma. Corpos tostados de vento. Rolavam pelas ondas, iam das águas à areia, arranhados, queimados e felizes.

Numa avenida movimentada, um transeunte que acabara de se mudar se deliciava em descobrir os pormenores da nova paisagem. Faixas de segurança que não estão. Placas que avisam sobre o perigo de abrir buracos nas ruas, sob pena de explodir o quarteirão ao perfurar um cano de gás natural.

Num quarto do subúrbio, um jovem de dezessete anos revisava pela centésima nona vez na semana as fórmulas de circunferência. Quarto infernal, caldeira de Satã. Exausto, com as preocupações comprimindo-lhe o cérebro, maldizia outra vez o vestibular iminente.

Num improvável apartamento convertido em sala de aula, um professor de piano sessentão repassava metodicamente ao aluno as sequências da apresentação de Ano-Novo. Notas rabiscadas a lápis, ilegíveis. As mãos do aprendiz esmurravam o instrumento, incapazes de cumprir a partitura.

Numa loja do shopping, a tia retardatária procurava os melhores presentes pros sobrinhos e afilhados. Lista de compras escrita à mão, em longa bobina. Equilibrava duas sacolas gordas, uma caixa grande, três caixas pequenas, uma latinha de metal escovado. E a bobina.

Numa associação de bairro, cinco moços mal barbeados se indignavam com o sol inclemente e os ventiladores quebrados. Mentes ágeis, férteis. Planejavam montar uma dissidência em quinze minutos e atingir a primeira centena de apoiadores na hora seguinte.

Numa ruela vicinal, um funcionário de companhia elétrica com quase duas décadas de casa fazia uma inspeção de rotina nos fios. Chaves desligadas, lares às escuras. Virava o pulso a cada cinco minutos para conferir as horas que o separavam do fim do expediente, das férias e da praia.

Num carro que cruzava estradas sob chuva, um piazote de seis anos mirava as gotas espatifadas nas janelas. Precipitação VERANIEGA, rápida. Enquanto a água não evaporava, escolhia duas gotas a esmo e fazia delas bólidos imaginários a competir por um troféu.

Num aterro sanitário longe de tudo e todos, crianças mal vestidas catavam alimento no lixo. Resquícios orgânicos putrefeitos mais rapidamente pelo calor. Vasculhavam sacolas com indiferença e só mudavam de ânimo diante da chegada de novos caminhões.

Numa lan house mal iluminada, mal climatizada e mal equipada, um gordinho de óculos e vinte e cinco anos era explorado. Doze reais a hora, o único espaço com internet naquela maldita praia. Entrava no Tuíter para dizer que havia conseguido entrar no Tuíter.

Num supermercado desfalcado, uma dona de casa de trinta e pico anos acumulava no carrinho um chester, um tender e ia atrás de espumantes. Gôndolas esvaziadas, estoques sumidos. Chegava ao ponto em que a pessoa se contenta até com cidra.

Numa escola que adiou aulas pela gripe suína, um estudante de quinze brigava com a prova de inglês que afastava a liberdade do verão. Verbo to be era o quê mesmo? Marcava ‘A’ em todas as questões objetivas e cogitava entregar a avaliação pela metade. Azar se ficasse em dependência.

Num balcão de bar, uns homens dividiam as atenções entre a tevê e os copos. A cerveja que tomavam, apesar de ser horário comercial em meio de semana, ou o futebol que viam, apesar de mal termos passado das cinco da tarde de uma terça-feira.

Num estádio de Porto Alegre, uns milhares de torcedores acompanhavam ao vivo a final de campeonato a que aqueles homens assistiam pela tevê e que não parecia interessar muito o resto do povo.

Haviam esperado até meia hora antes da partida para começar a entrar no recinto, porque a Brigada se atrasou.

Nesse estádio, Grêmio e Atlético Mineiro disputaram o título brasileiro sub-20.

Um certo Alex marcou o gol do 1 a 0 e do título, mas depois fraquejou tantas vezes que saiu de campo vaiado e sob gritos de “bicha! bicha!”.

Um goleiro cujo nome muitos ainda estão aprendendo a escrever, Busatto, foi eleito o melhor jogador dum torneio que deveria revelar craques da linha.

Um capitão de Seleção Brasileira, Lúcio, esteve presente para entregar medalhas aos guris (e ser nomeado Embaixador de Porto Alegre para a Copa de 2014).

Um troféu de bicampeonato do Grêmio foi erguido por Saimon, o honrado capitão azul, negro e branco, que um dia torceu pelo Inter.

E todos aplaudiram.

Nesse estádio, o Passo d’Areia do São José, terminou o 2009 do futebol brasileiro. Em dezembro, e não nos primeiros meses do ano seguinte - um avanço de organização concretizado nesta década, a qual também se acabou.

Fotos minhas. Atraso por culpa de problemas com a CONEXÃO ao MUNDO.

2 comentários:

Anônimo disse...

Online Casino Games tyuueooru
http://stonewalljacksoncarnival.org/ - Free Casino
So you can have a wonderful gambling experience with the comfort at your home.
[url=http://stonewalljacksoncarnival.org/]Casino Gambling[/url]
So you can have a wonderful gambling experience with the comfort at your home.
Free Casino Gambling
All you need to is a well operating computer and an Internet connection and you?re done with your gambling.

Bocha disse...

Hola que tal

Soy Bocha, creador del blog Abran Cancha. Estoy muy interesado en tener un intercambio de links con tu blog, la verdad que me ha gustado mucho y seria un honor tenerlo entre mis enlaces. Un abrazo grande.

ABRAN CANCHA
www.abran-cancha.blogspot.com