quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Até onde eles podem

A história você conhece. No dia 28 de agosto de 1963, mais de trezentos mil manifestantes, estadunidenses de ascendência africana, marcharam sobre Washington para clamar por empregos e liberdade. Movimentos equivalentes pipocaram antes e depois daquilo, resultando numa ampliação dos direitos civis aos negros. A efeméride ocorrida na capital do país, porém, destacou-se dentre as demais especialmente pelo discurso do líder Martin Luther King Jr. – o apaixonante I have a dream.

Quarenta e cinco anos depois, ontem, Barack Obama tornou-se o primeiro negro eleito presidente dos Estados Unidos. Só se fala nisso, não há outra notícia no mundo nesta semana – e nem poderia ser diferente. É tentador comparar Obama e Luther King, achar semelhanças – negros, extraordinários oradores... – e estabelecer os contrastes entre as duas épocas. Em pouco menos de meio século, o avanço do ponto da segregação racial que negava direitos mínimos aos negros à escolha de um homem de cor para o cargo mais importante do mundo.

Notável, a evolução. Porém, peguemos aquele discurso de Luther King em 1963, garimpemos um trecho em que ele dizia aos negros que carregassem consigo a mensagem da resistência pacífica e da esperança, mas que levassem isso de volta para casa: “Go back to Mississippi, go back to Alabama, go back to South Carolina, go back to Georgia, go back to Louisiana...

Os estados citados nominalmente estavam lá como exemplos gritantes de racismo. Em 2008, não exclusivamente por esse motivo, mas tampouco por mera coincidência, aqueles cinco estados estiveram entre os 22 vencidos por John McCain. No Alabama, que em 1963 possuía um governador de cujos lábios “escorriam palavras de interposição e anulação” dos direitos dos negros, segundo Luther King, Obama sequer chegou a 40% da preferência popular. Apesar de todas as conquistas, a mudança de alguns aspectos exige muito mais tempo.

Com o Anorthosis Famagusta foi assim. Em sua participação épica nesta primeira fase de UEFA Champions League, encantando por superar as expectativas naturalmente pessimistas, o time cria recordes e faz um monte de coisas pela primeira vez entre os clubes cipriotas. O primeiro a disputar uma fase de grupos, o primeiro a pontuar, o primeiro a – espetacularmente – vencer! Triunfasse contra um gigante continental e sua participação de estréia ganharia um broche de ouro.

Um time do Chipre vencer o campeão da Itália seria contrariar todo um passado de testemunhos contra uma proeza do tipo. Na terça-feira, o Anorthosis que liderou o placar durante meia hora sobre a Internazionale de Milão cedeu o empate a nove minutos do apito final, depois de uma brava oposição na partida inteira, encerrada com a bela contagem de 3 a 3. Não reduziu a festa: igualar-se a um clube com a grife da Inter, para um cipriota, é quase tão monumental quanto receber a Casa Branca como moradia pelos próximos quatro anos. Mas provou que certos extras, um negro levar os delegados dum Alabama, ou um Anorthosis derrotar uma Inter, não são para agora.

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Outros resultados da Champions League:

Roma 3-1 Chelsea
CFR Cluj 1-2 Bordeaux
Werder Bremen 0-3 Panathinaikos
Barcelona 1-1 Basel
Sporting 1-0 Shakhtar Donetsk
Liverpool 1-1 Atlético de Madrid (com um pênalti inexistente para os ingleses aos 90+5)
Olympique 3-0 PSV
Celtic 1-1 Manchester United
Aalborg 2-2 Villarreal
Fiorentina 1-1 Bayern München
Lyon 2-0 Steaua Bucareste
Arsenal 0-0 Fenerbahçe
Dynamo Kiev 1-2 Porto
Real Madrid 0-2 Juventus
BATE Borisov 0-2 Zenit

Um comentário:

San Tell d'Euskadi disse...

Brum,

Quando o candidato considerado negro for republicano, e pela qualidade dos quadros do partido, acontecerá em breve, este levará o Alabama e perderá Massachusetts. É inevitável. A escolha foi partidária, não cromática.

Um abraço.