quinta-feira, 22 de maio de 2008

A noite do Fluminense

Caberia falar do Boca Juniors e sua nova façanha, destroçando o Atlas, no México, por grandiosos 0-3, em hat-trick de Palermo. Mas o feito boquense é apenas mais um na sua história. E um feito que compartilha data com o que se viu no Maracanã, a monumental festa da torcida do Fluminense. Esta noite de Libertadores precisa ser de um time só. Que seja do autor do inédito. Que seja do Fluminense.

E assim foi a noite do Fluminense. Um Maracanã lotado, uma necessidade de remontada. Remontar um 1-0 adverso é algo diferente de qualquer outro placar. Porque 1-0, ao contrário dos resultados por margem maior, guarda palpáveis chances de recuperação – e, também diferentemente de outras derrotas por um gol de diferença, mas marcando fora de casa, oferece a relativa dificuldade de não poder ter as redes balançadas em casa, sob pena de cair pelo tento qualificado. O 1-0, em sua agridoce facidificuldade, consegue sustentar a emoção de um jogo e as aspirações das duas equipes por quase todo o tempo. Raramente, porém, gera epopéias. Hoje, a raridade foi o caso.

Pois o que o Flu fez foi uma epopéia. A maior da sua história. Depois do jogo, um certo jogador dos tricolores cariocas diria, com inquestionável razão, que a torcida do seu clube era carente de conquistas; tinha história, memória, orgulho, mas faltava, definitivamente, uma conquista de relevo. Foi por ela que o onze de Renato Gaúcho – este, um velho conhecedor de jornadas sul-americanas – entrou em campo para matar. E ainda sonhando com ela, num lance confuso, um desvio desajeitado, de artilheiro matador oportunista, saiu o gol que anulava as vantagens do São Paulo na eliminatória, obra de Washington, quebrando seu jejum. Com 12 minutos no Maracanã, fazia-se a remontada, abriam-se novas possibilidades. O 1-0 era verde, vermelho e branco. O 1-1 no agregado era de ninguém.

O jogo seguiu. O Fluminense acertou a trave, o São Paulo parou sem resposta. Ficou assim até o início do segundo tempo, e então voltou a crescer. Apossou-se da partida de tal forma que o seu gol ficou previsível. O empate veio com Adriano aos 70 minutos, trazendo ares de que sentenciava a eliminatória. Nada mais tiraria os paulistas da América. Engano. O empate foi a ruína do São Paulo. Não seria. Valeria, sim, a classificação, acabaria de vez com as esperanças do Fluminense, confirmaria a superioridade visitante na etapa complementar, não fosse o pequeno detalhe: no minuto seguinte à igualdade, o time da casa se aproveitou de falhas defensivas do adversário para voltar a liderar a contagem, por 2-1. E aí, o morto Fluminense, o dominado Fluminense do segundo tempo, ganhou um ímpeto que não tivera até então naqueles últimos 45 minutos.

E tentou de todas as formas fazer a sua história inédita. O time das Laranjeiras, não é novo, jamais havia superado uma fase de grupo de Libertadores até 2008 – e neste ano poderia atingir semifinais. A grandeza disso talvez seja melhor percebida no português lusitano: as meias finais; o Fluminense poderia ser um meio-finalista da América, um quarto de campeão, até. Pode parecer sarcasmo ou ironia, mas não é. Para um clube que jamais chegara tão longe, é aquela conquista tão almejada, e a proximidade de coisas maiores. Mas isso só viria com um terceiro gol do Flu. Que não queria aparecer. Rogério Ceni, Rogério Ceni, Ro-gé-rio Ce-ni. Oitocentas e duas vezes foi possível ouvir o nome do arqueiro são-paulino nos dez minutos finais. Vilão no segundo gol do time local, agora ele parava tudo. Assim como agarrava os esféricos chutados, parecia se abraçar à vaga de tal forma que ninguém conseguiria puxá-la de seus braços.

Só Washington, o autor do primeiro gol. Só aos 90+2 minutos, na derradeira esperança do Maracanã lotado para a maior noite continental da história do Fluminense. Num escanteio da direita, Washington Coração Valente subiu à maior altura que pôde alcançar, para levar o Flu a alturas jamais sonhadas – e tocar el cielo. De cabeça, ele desviou o centro para as redes da goleira, no que definiu como o gol mais importante da carreira. Explodiu o Maracanã. Fez o inédito. O Fluminense é um semifinalista da Libertadores, e não de qualquer maneira, mas ao modo copeiro, com luta, remontada e gol no fim. O Fluminense passou no teste. Agora sim, pode sair do simples sonho e se dizer postulante ao título.

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