Denominada Liga BBVA por conta do patrocínio, a segunda divisão espanhola, formada por 22 equipes, avançou mais um pouco no último final de semana, chegando à rodada 30. No topo de uma classificação que só concede acesso aos três melhores, aparecem o Numancia, líder com 60 pontos, e o Málaga, vice, com 56. Os mais prováveis times a subir de divisão, porém, são desimportantes nesta altura. A emoção do campeonato está direcionada para a interminável disputa pela última vaga: na expectativa do terceiro lugar, digladiam-se dois tradicionais.
É uma região pantanosa, onde uma fina linha marcada nas tabelas pode definir toda a história de uma temporada e projetar a próxima. Ali, do terceiro para o quarto lugar, um ponto, um gol, um confronto direto, qualquer mísero detalhe é capaz de diferenciar heróis de fracassados, gloriosos de incertos. No fim de semana, separados por um único ponto, esses dois personagens tão próximos e, ao mesmo tempo tão distantes, se enfrentaram.
Estamos falando do jogo entre a Real Sociedad de San Sebastián e o Sporting de Gijón. A importância das duas equipes para o futebol espanhol é das maiores, e ambas pertencem ao seleto grupo de nove clubes que jamais disputaram divisão inferior à segunda do futebol nacional. Mesmo assim, é preciso relembrar um pouco da história para entender o que estava em jogo naqueles noventa minutos capazes de definir o restante do ano para os dois lados.
Quem não apagou a memória recente certamente recordará da Real Sociedad da temporada 2003, um timaço que disputou o título espanhol até o fim com o Real Madrid, deixando de ilusioná-lo apenas na rodada final, quando confirmou-se a magra diferença de pontos em favor dos merengues: 78 a 76. Faltou competência, porém, para os dirigentes contornarem as crises econômicas e manterem aquela força. Em 2006/07, após 40 anos de primeira divisão, veio o rebaixamento. A história do time basco, rival do Athletic Bilbao, inclui um recheado palmarés: duas Ligas (1981 e 1982), duas Copas do Rei (1909 e 1987) e uma Supercopa da Espanha (1982). Também merece destaque o famoso vice-campeonato de Copa em 1928 – contra o Barcelona, o time perdeu a taça apenas depois de três finais, igualando as duas primeiras em 1-1 e sendo derrotado no embate decisivo por 1-3. Internacionalmente, conta treze participações nas mais variadas copas da Europa.
Com menos taças mas igualmente históricos, os de Gijón, fundados em 1905, são o clube mais antigo da segunda divisão atual. Costumavam fazer célebres clássicos contra o rival local das Astúrias, o Real Oviedo, mas acabaram assistindo ao oponente despencar até a quarta divisão – hoje, os dois times enfrentam-se apenas no Trofeo Principado, disputado na pré-temporada. Antes de ser rebaixado, o Sporting passou 36 temporadas consecutivas na elite, construindo uma tradição copeira, especialmente nos mágicos anos que fecharam a década de 1970 e abriram a seguinte: em 1979, vencendo metade dos 34 jogos disputados na Liga, acabou vice-campeão espanhol, quatro pontos atrás do Real Madrid; em 1981 e 1982, aplicando goleadas históricas, o time atingiu duas finais consecutivas de Copa do Rei, sendo vencido, respectivamente, por Barcelona e Real Madrid. O sucesso dentro do país rendeu ao time seis participações na Copa da UEFA, fazendo-se respeitado para além das fronteiras. Um desastroso 1998, porém, provocou o rebaixamento ainda não superado.
O encontro de sábado entre os dois times, portanto, era muito mais que um enfrentamento de topo de tabela: era a luta para se firmar na zona de retorno à divisão que deveriam disputar por direito. Jogando em El Molinón, seu estádio, o Sporting, até então atrás na tabela, acabou levando a melhor. Com um gol agônico, aos 82 minutos, garantiu um necessário triunfo por 1-0, e deu a volta na classificação: pulou para a 3ª posição, com 50 pontos, e deixou a Real em 4º lugar, parada nos seus 48. Após uma década de dor, vencer o confronto direto fez Gijón voltar a sonhar. Ainda faltam longas doze jornadas, bastando uma para aniquilar as duas unidades de vantagem, mas no fim de semana, após o árbitro sentenciar o final da partida, ninguém queria pensar nisso. Estavam certos de que o fim do caminho de volta nunca estivera tão visível.
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