Por uma dessas razões universais que movem o homem – a mulher (ou uma mulher em especial) –, Danrlei passou muitas das suas semanas de ócio em Ijuí no ano passado. Nesse meio tempo, brigou, distribuiu autógrafos, chegou a ser cogitado como reforço do São Luiz (teria pedido demais e sido mandado pastar) e, enquanto os meses corriam, disputou algumas partidas em campinhos de futebol sete ou quadras de futsal.
O Zeca, que citei aqui anteriormente, meu amigo colorado, portanto não muito afeito ao Danrlei e suas danrleizices, teve a honra de participar de um desses jogos. E até hoje guarda como um troféu de batalha a memória do gol que QUASE fez no maior goleiro da história recente do clube rival do clube que ama. Diz ele que corria, corria e corria na direção da área adversária. Corria como se estivesse numa pista interminável de sonho, daquelas coisas que começam quando se fecha os olhos e só acabam no tocar do despertador da manhã seguinte.
Uma correria desenfreada, a do Zeca, mas, contrariando as aparências, não interminável. Em algum pedaço do momento eterno, ele chegou à área adversária. Em um instante, parou, olhou, pensou, viu um companheiro desmarcado, teve a certeza de que o gol seria certo se desse o passe, porém deu um bilhete só de ida às favas para as preocupações e fez a pergunta: “quando eu vou ter outra chance de meter um gol no Danrlei?”. Decidiu. Chutou. Chutou forte, como se todo o significado da existência dele estivesse naquela pelota que cortava o ar.
E errou.
O significado da existência dele estourou na parede atrás da goleira, porque a bola, desgraçadamente, passou raspando a trave do Danrlei e não entrou. A pergunta que o Zeca se fizera instantes antes, sobre em qual ocasião reapareceria a oportunidade de vazar o Danrlei, foi respondida logo depois: o ex-goleiro gremista abandonou a meta e passou a jogar na linha, como costumava fazer naquelas partidas. Sim, o Danrlei não gostava de disputar as peladas no gol. Talvez por amor-próprio, para não deixar os Zecas da vida contarem às gerações futuras sobre os seus feitos contra um profissional decadente em alguma tarde dominical, sobre alguma quadra esquecida.
Ontem eu estava ao lado do Zeca e de mais dois amigos, nas arquibancadas do pavilhão do 19 de Outubro, e todos juntos gritávamos o coro que, em onda, tomava aquele setor do estádio: “Danrlei! Danrlei! Danrlei!”. Uma saudação irônica. Eram seis minutos do segundo tempo da partida do São Luiz contra o Brasil de Pelotas, e Danrlei havia acabado de repetir o que muito se vira na estreia xavante no Gauchão: espalmou uma bola nos pés do jogador adversário, entregando um gol de bandeja. No Bento Freitas, dia 3, foi para Eraldo, do Santa Cruz. Ontem, o lento Carlos Lima aproveitou o rebote para fazer 1 a 0 a favor do São Luiz. O Zeca comentou:
– Ele devia ter jogado mais vezes no gol contra nós. Pelo menos teria treinado.
De fato. O Danrlei desse Gauchão está sendo o rombo no casco do navio do Brasil de Pelotas, branqueando os cabelos de todos aqueles que depositavam nele as maiores expectativas para o campeonato. Depois do primeiro gol são-luizense, Danrlei espalmaria outras três bolas semelhantes, que dessa vez o time de Ijuí não aproveitaria. Ainda assim, o que as falhas não fizeram, um golaço de Fabiano Veiga consumou: disparando um míssil teleguiado desde a intermediária, acertou o ângulo direito dos xavantes e aumentou para o 2 a 0 final aos 68 minutos.
Haveria ainda uma bola na trave chutada por Barão, a onze minutos do fim. O placar “amplo” confirmou o que se imaginava. O Brasil, tradicional freguês em Ijuí, continua sumindo em campo no segundo tempo pela falta de preparo físico, e agora terá que fazer milagres para obter bons resultados nesse seu zanzar pelo estado, que inclui quatro jogos nos próximos sete dias, e o São Luiz convive com a garantia de que neste momento estaria LÍDER DO GRUPO (e classificado) se não tivesse perdido um jogo imperdível para o Avenida. Agora precisa buscar pontos em Caxias do Sul, contra o Juventude, na última rodada.
Claro, também confirmou que se o Danrlei evitava jogar as peladas no gol para não correr o risco de um fiasco, este Gauchão de fim de carreira está tratando de arruinar cruelmente o seu orgulho. Ter levado um gol do Zeca não seria nada comparado a sofrer um de Maurício (que eu perseguirei até o fim dos dias se continuar se arrastando em campo). Felizmente para Danrlei, Itamar Schulle resolveu atender às preces da torcida, adotando uma tática astuta, com o deslocamento do centroavante são-luizense para o banco de reservas. Quando entrou, no fim da partida, Maurício sequer fez esforço para correr atrás da bola e não ameaçou a moral de Danrlei.
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