quarta-feira, 30 de abril de 2008

O Chelsea de Lampard

Não era preciso mais que um empate por zero a zero para o Chelsea ir à final da Champions League. Havia a possibilidade de optar pelo caminho fácil, sem gols nem graça. Mas não poderia ser assim. Para fazer história, eliminar o Liverpool, jogar sua primeira decisão do maior torneio do continente, era necessário tornar a jornada desta quarta-feira memorável.

E assim foi. Sob o peso de duas eliminações para os Reds nessa mesma fase, em 2005 e 2007, a equipe de Londres conhecia os perigos de tentar o caminho mais simples, defendendo-se, e optou por martelar a meta de Reina. Com 33 minutos, Drogba converteu o zero a zero suficiente num um a zero de delírio, placar mantido pelos seus companheiros até a metade.

Tivesse vencido a primeira partida, o Liverpool estaria, àquela altura, apenas tendo a possibilidade de prorrogação – e não de eliminação instantânea – aberta. Ah, como o gol contra de Riise fazia diferença... Seria necessário reagir. Uma vez mais, a camisa deveria pesar, os de Rafa Benítez jogariam em igualdade a um adversário cujo futebol, a tabela da Liga Inglesa mostra, é melhor. O empate saiu aos 64 minutos, com Fernando Torres.

O cenário ainda se constituía. Num átimo, alguém poderia ter um déjà vu e compreender o significado dos lances até ali – um mero prólogo. O agregado de 2-2, dividido em dois empates a um em Anfield e Stamford Bridge, movia os aficionados ao plano comum do suspense. Viria a prorrogação, com todo o seu drama.

Há um ano, a meia hora extra fora insuficiente para definir um finalista, conduzindo o mata-mata aos tiros desde os onze metros. Hoje, em apenas quatro minutos se percebeu que os pênaltis, ao menos aqueles após o jogo, não seriam necessários: Essien mandou um tiro forte para as redes, gol anulado pelo juiz em função de um questionável impedimento de ofensivos dos Blues que, sem participar diretamente da jogada, teriam obstruído a visão de Reina.

As reclamações se dissipariam pouco depois. Aos 96, um pênalti claro possibilitou que Lampard, o símbolo de um Chelsea anterior aos tempos de fartura atual, um Chelsea que não ousava chegar em semifinais de Champions, fizesse o seu gol. O gol de sua torcida, o gol da história do seu clube. E ali a noite se tornou memorável. Se os azuis só foram tão longe graças aos investimentos recentes de Abramovich, conquistando simpatizantes totalmente ignorantes sobre a história do clube, desfazendo-se de suas tradições, ao menos no momento do gol histórico, da antologia, fora um representante de outra era o responsável pela vantagem que não seria mais perdida. Um representante que, sofrido como um time que tantos anos militou na segunda divisão, jogava de luto, carregava uma faixa negra em homenagem à mãe, falecida há menos de uma semana. Dois a um e final.

Ainda haveria muito mais. Drogba apareceria novamente, fazendo 3-1 aos 105, e o Liverpool começaria a ver o tempo escassear. Embora talvez o problema nem fosse tempo, que sempre há para equipes como os Reds – o que faltava, muito provavelmente, era a faísca mágica que impulsiona o time às remontadas: não se ouvia You’ll never walk alone naquele sonhador e lotado estádio londrino!

Babbel até fez, sim, o gol que descontou a diferença, numa falha de Cech, a três minutos do fim, mas foi como se não houvesse convertido. Ao contrário do esperado, pouco adiantou para uma ofensiva letal nas últimas voltas do cronômetro. O Chelsea era soberano, e até atacava. Atacava ao ponto de, com 52 segundos de acréscimo no último tempo da prorrogação, forçar o L’pool a cobrar um tiro de meta, tornando-o refém de sua própria bola dominada: tão logo o esférico voasse, o apito final soaria.

E soou. Pela primeira vez na história, o Chelsea está numa final de Copa da Europa. Quer tocar o céu, e almeja o vôo mais alto de todos os tempos. Um vôo que o Chelsea dos torcedores, o Chelsea sofrido do qual Lampard é resquício, talvez cresse impossível.

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