segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Gloria al Bravo Pueblo (ou O fato do ano)

Nasceu a Venezuela para o futebol. O parto foi ontem. A gestação começou no início deste século, após décadas de humilhações, tendo no treinador Richard Páez um dos principais responsáveis – de 2001 a 2007, ele comandou desde o selecionado nacional sub-20 até o principal, vendo da casamata como a Vinotinto alcançava resultados inéditos.

Uma evolução, devagar e sempre. Quando assumiu a seleção maior, Páez tinha em mãos uma equipe cuja única “tradição” era a de perdedora nata. Até ali, com dez rodadas do qualificatório à Copa do Mundo de 2002 disputadas, a estatística venezuelana em Eliminatórias em todos os tempos contava 62 partidas, 53 derrotas, seis empates e míseras três vitórias – duas contra a Bolívia (em 1981 e 2000) e uma contra o Equador (em 1993).

Com Richard Páez, os triunfos raríssimos viraram plausíveis, e bastou um ano para superar todo o passado: de agosto a novembro de 2001, pelas últimas rodadas daquelas Eliminatórias, os venezuelanos encadearam quatro vitórias seguidas (2-0 sobre o Uruguai, 0-2 no Chile fora de casa, 3-0 contra o Peru, e 3-1 em cima do Paraguai).

Nas Eliminatórias seguintes, à Copa do Mundo da Alemanha em 2006, a Venezuela fez cinco vítimas, sequenciando sua melhora nas classificações históricas: Colômbia (0-1 fora de casa), Bolívia (2-1), Uruguai (com o monumental 0-3 no Centenário, no que se chamou Centenariazo), Equador (3-1) e Peru (4-1). Em 2007 veio a Copa América realizada no quintal de Chávez, e outra vez ocorreu o jamais visto: os do traje vinho tinto superaram a fase de abertura.

Passada a derrota nas quartas-de-final, Richard Páez saiu por vontade própria, assinando uma herança que incluía bases bem estabelecidas para o futuro. Enquanto a seleção principal continuou sua crescente, tendo as vitórias por normais (são três em dez rodadas das atuais Eliminatórias) e obtendo seu grande êxito ao derrotar o Brasil por 2 a 0 num amistoso, os times de jovens passaram a render frutos cada vez melhores depois da popularização do esporte no país.

Em 2007, no Sul-Americano Sub-17, o quadro venezuelano acabou em quinto lugar, deixando a vaga no mundial escapar na última rodada, por um ponto. Neste ano, usando parte daquela própria equipe, agora no Sul-Americano Sub-20, a Venezuela chegou à maior façanha do seu futebol até o momento – com a honra de atuar em casa, já que o Peru perdeu o direito de sediar a competição por conta das crises políticas envolvendo a sua Federação, virou um time mundialista.

A Vinotinto superou a primeira fase do torneio invicta, liderando um grupo que tinha a atual campeã do mundo (e, no fim, decepção) Argentina, chegando sonhadora ao hexagonal final. Com percalços, vencendo na estreia para depois ser goleada duas vezes consecutivas (3-0 para Paraguai e Brasil na segunda e terceira rodadas), ela chegou ao último jogo precisando de uma vitória para conquistar uma vaga no Mundial a ser disputado no Egito. Bateu o Uruguai por 3 a 1, classificando-se ao lado dos próprios celestes, dos paraguaios e dos brasileiros.

Finalmente o Gloria al Bravo Pueblo, único hino nacional sul-americano que jamais havia soado num campeonato mundial de futebol, será ouvido pelo resto do planeta. Sim, veio ao mundo a Venezuela. Não mais que um torneio sub-20, claro, mas algo de significado enorme para um país que se dedica há uma década a cambiar os antigos estigmas de perdedor. Estão vindo os resultados. Desse jeito, chegar a uma Copa do Mundo parece cada vez menos impossível. É questão de tempo. Pouco tempo.


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