quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

O Peñarol de Lérida

PARIS (18/02/2008) - As camisetas aurinegras lembravam o Peñarol. A princípio, as identificações com o gigante uruguaio parariam por ali: o semi-amador Atlètic Alpicat, de Lérida, mero competidor de uma esquecida divisão regional espanhola, não deveria estender para além das cores qualquer espectro de grandeza. Com a bola rolando, igualmente, o FC Andorra local trataria de apequená-lo.

Para que as expectativas do Alpicat deixassem de ser "vencer" para se transformarem em "remontar", foram necessários apenas cinco minutos. Cinco minutos, um espaço de tempo minúsculo dentro de uma rodada de futebol que começava às 12 horas e terminava às 22, mas todo o tempo necessário para o gol mais belo do dia: de bicicleta, Juli Sànchez venceu a instável defesa visitante para colocar o Andorra em vantagem.

O maior adversário. Nem o gol de Valdivia, empatando aos 15 minutos, pôde mudar a imagem do jogo: inferior, o Alpicat acabaria se convertendo em seu mais temível adversário - o Andorra era um oponente "fácil"; difícil, aos aurinegros, era sobreviver à sua própria defesa. Depois de arruinar suas jogadas uma a uma e ver seu campo constantemente assediado pelos locais, o Alpicat cedeu e fez o trabalho sujo: gols... contra.

Começou aos 31 minutos da etapa inicial, quando Manolo Jiménez cobrou falta para o Andorra e viu a bola desviar decisivamente na cabeça de um defensor antes de encontrar as redes. Um gol que as cartilhas mandam dar ao cobrador, embora a autoria seja, na realidade, dividida com o infeliz zagueiro. Se o 2-1 foi por culpa da infelicidade, o 3-1 não. "Vou fazer uma ponte antológica e salvar esse cruzamento", deve ter pensado o goleiro Torbi, do Alpicat, antes de saltar para agarrar a bola vinda da direita, centrada por Ribo. Acabou socando a pelota contra sua meta... para festa da minguada torcida local - se ficasse parado, provavelmente veria a bola passar à sua frente antes de sair pela linha de fundo. Um desastre. Era o quinto minuto da etapa complementar e remontar já soava impossível, a menos que surgissem dois pontos imprescindíveis para se reagir, no futebol: um herói e um fator desencadeante.

O herói e o gatilho. Ao terceiro gol do FC Andorra, seguiu-se mais meia hora de desespero e iminência de goleada para os aficionados de Lérida, que foram em bom número a Aixovall. Meia hora para que Felipe, do time da casa, visse o segundo cartão amarelo e, a dez minutos do fim, deixasse os andorranos com um a menos em campo. Estava engatilhada a reação. Nos dez minutos faltantes, precisava surgir um herói. E ele apareceu.

Na realidade, já estava determinado desde o primeiro empate aurinegro, mas ninguém notara: Valdivia, autor do único tento dos de Lérida até então, ressurgiria como pendão da garra de sua equipe. Sob seu comando, os antes tímidos companheiros de time também cresceram - deixaram de ser pobres oprimidos, sem defesa, com um 3-1 nas costas, para se tornarem um exército bárbaro que procurava o gol do Andorra como se lá estivesse a próxima cidade a ser arrasada.

No minuto 88, começou a queda de Roma, ou do Andorra. Valdivia recebeu um lançamento na entrada da área, tirou o arqueiro adversário do lance com um toque sutil e ficou com a meta aberta para concluir seu golaço e diminuir a desvantagem. Dois minutos depois, o herói, o líder bárbaro, outra vez apareceu metido entre os defensores andorranos para conseguir um pênalti. 90 minutos e a improvável remontada, pelo menos até o empate, estava à borda de se concretizar.

Quem bateu foi Toni Pascual. O goleiro salvou no primeiro lance, mas aquele não era mais um jogo nas mãos de seu time: os de Lérida jamais deixariam a chance escapar. No rebote, o próprio Toni assinalou o 3-3 definitivo. Na agonia dos minutos finais, comprovou-se que as cores eram mais que casualidade. A raça do Atlètic Alpicat também trouxe à memória o Peñarol dos bons tempos.


Vídeo com o primeiro e terceiro gols do Alpicat (1-1 e 3-3, respectivamente), e o segundo gol do Andorra (2-1)

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