sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

A maldição de Marselha

Copa da Europa em 1993: ano da maior glória e da maldição

Pesarosos, eles assistem ao Lyon caminhar tranqüila e firmemente rumo ao heptacampeonato francês. Com os olhos marejados, preferem não ver o time de Juninho Pernambucano. Os torcedores do Olympique Marseille tentam, por alguns instantes, imaginar que o grande francês de hoje não é o time de Gerland, mas sim a equipe branca e azul celeste que mandou no país até a metade da década passada. Não conseguem. Voltam à realidade e vêem o seu Olympique enfileirando insucessos.

Diz-se, daqueles que um dia foram reis, que a majestade nunca é perdida. Aos de Marselha, contudo, é difícil fazer a crença no ditado se manter. Seu reinado começou em 1989, com a conquista da Copa da França e do Campeonato Francês. Antes disso, o OM, como também é chamado, já era importante, mas não daquela maneira. Nem eles, nem a França haviam conhecido tamanha grandeza até então. Era o esquadrão de Papin, Boli, Mozer, Amoros, Waddle, Abedi Pelé, Desailly, Deschamps, Völler, e muitos outros, que estava em plena formação. Era um time mágico, quase imbatível, que encantava os torcedores.

E o estádio Vélodrome lotava invariavelmente. A maior e mais fanática torcida francesa era, talvez, o jogador mais importante daquele time mágico - em cinco longas temporadas de liga, a equipe foi derrotada míseras quatro vezes dentro de casa. Em cinco temporadas de liga, de 1989 até 1993, o OM ganhou todos os Campeonatos Franceses, e chegou muito mais longe que o tímido Lyon de hoje jamais ousaria: foi a duas finais da Copa dos Campeões da Europa. Em 1991, perdeu; em 1993, não - em Munique, venceu o Milan por 1-0, gol de Boli, e tornou-se o único clube francês da história a erguer a maior taça do continente. Foi o ano da maior glória, mas também seria o da maior desgraça.

Desgraça porque, seis dias antes da antológica final, o time venceu uma partida decisiva da liga diante do Valenciennes - subornando. O adversário era medíocre e o triunfo viria ao natural, mas os dirigentes não quiseram arriscar: valia o inédito penta-campeonato francês, e logo atrás, Monaco e PSG vinham com chances reais de estragar a festa, até a rodada final. O Olympique comprou o jogo, venceu, e começou a se desintegrar. Alguns jogadores do Valenciennes denunciaram o esquema, desencadeando uma investigação devastadora. Em pouco tempo, o OM teve seu troféu nacional da temporada cassado, e perdeu seus direitos sobre competições internacionais - mantinha o título da Copa dos Campeões, mas não poderia jogar nem a Supercopa Européia, nem o Mundial de Clubes. Perdeu também o prestígio e boa parte dos grandes jogadores de sua lendária equipe. Estava no fundo do poço quando, um ano depois, as investigações foram encerradas e o veredicto final foi dado: além de tudo o que viera antes, o time de Marselha também seria obrigado a jogar a segunda divisão na temporada 1994/95.

Iniciou-se ali uma maldição. Embora o retorno à elite não tenha tardado (o OM ascendeu em 1996/97), o clube nunca mais ergueu taça alguma. Manteve sua grandeza, chegou a várias decisões mas, nelas, via-se impotente, apequenado. A mesma fraqueza de espírito que acometeu os dirigentes do clube naquele trágico suborno de 1993 parece pairar sobre os jogadores da equipe nas decisões de hoje. Em 1999, perdeu a decisão da Copa da UEFA para o Parma italiano; em 2004 voltou a ser derrotado na final daquela competição, agora pelo Valencia da Espanha; em 2006 e 2007, chegando duas vezes à final da Copa da França, acabou com dois fracassos consecutivos. E não parece haver trégua mesmo nas decisões que não são propriamente finais: no ano passado, última rodada da fase de grupos da Champions League, bastava um empate em casa contra o Liverpool para garantir classificação - acabou levando humilhantes 0-4 e sendo eliminado.

A fanática torcida, a maior da França, mesmo sofrendo tantos golpes, segue lotando o Vélodrome e sonhando. Mas, pesarosos, com a visão embaçada pelas lágrimas, só conseguem notar o brilho de outras equipes. Entre uma desilusão e outra, vêem seus feitos caindo no esquecimento enquanto o Lyon tenta ser aquilo que o Olympique um dia foi.

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