terça-feira, 29 de janeiro de 2008

Espetáculo

BARCELONA (28/01/2008) - Ontem, ainda em Madrid, uma noite de espetáculo, assistindo ao provável maior jogo da jornada européia do blog e, certamente, ao melhor jogo do Campeonato Espanhol desta temporada. Separado do gramado do Bernabéu por algumas míseras fileiras de cadeiras, acompanhei, in loco, o tão falado Real Madrid do futebol pragmático e feio - mas que, ontem, resolveu brindar o estádio lotado com uma atuação memorável.

Os ruídos que cercam um estádio e antecedem uma partida de futebol são os mesmos em qualquer lugar do mundo. Cornetas, cânticos de guerra, comentários sobre os jogadores e a partida que viria a seguir recheavam as horas de aguardo até a abertura dos portões - algo que, num reflexo da agilidade e organização espanhola, só ocorreria 75 minutos antes do apito inicial. Na noite de um domingo que reservava o duelo entre o primeiro e o terceiro colocado da Liga, todos os caminhos da capital levavam ao Santiago Bernabéu. Caminhos que conduziram 78 mil pessoas para llenar hasta la bandera, ou lotar completamente, os lances de cadeiras.

De vital importância para o restante do campeonato, o mais que esperado confronto do Madrid frente ao Villarreal cresceu em significado tão logo os primeiros aficionados passaram a se acomodar nas gradas: no alto, o telão anunciava o 1-1 entre Athletic Bilbao e Barcelona, um imperdoável tropeço catalão. Vencendo, o Real Madrid se aproximaria ainda mais de um título que poucos crêem já não ser seu - a vantagem, então de sete pontos, subiria a gigantescos nove. Quase inalcançáveis, mesmo sendo apenas a rodada 21. Os jogadores blancos já sabiam disso quando ingressaram no gramado e encararam todos os anéis do estádio cheios. Uma vez mais, ao Madrid, era preciso repetir a doce rotina desta temporada, vencendo um duelo dentro de casa.

Só que o jogo não era rotineiro. E a primeira prova disso viria a poucos metros de mim, logo à frente, na goleira em que a invencibilidade de Iker Casillas foi quebrada - num chute indefensável, um golaço de Rossi, o Villarreal igualava o placar em 1-1, aos 15 minutos. À minha frente, a muralha ruiu. Sete minutos antes disso, a contagem havia sido aberta em uma arrancada fulminante de Robinho, pelo centro da zaga, após um passe de extrema genialidade dado por Guti, vendo um espaço vago entre três marcadores e alçando o brasileiro à glória. O jogo era movimentado, emocionante, excelente. Poucas faltas desnecessárias, poucos lançamentos infrutíferos: bola no chão, passes precisos, oportunidades interessantes e, sobretudo, duas equipes francas, que davam grandes espaços para o jogo se desenrolar.

Placar de 1-1 no intervalo, mas um confronto capaz de dar mais. E mais viria, com o apito que autorizava a disputa dos três quartos de hora decisivos. Agora, era no meu lado em que o Madrid, atual equipe de melhor campanha entre as grandes ligas do continente, atacaria. E era no meu lado em que os gols da vitória merengue ocorreriam. Com 52 minutos, Robinho marcou novamente - um lance que começou em arrancada brilhante de Sergio Ramos, continuou com séries chutes dos companheiros dentro da área, defesas espetaculares do arqueiro Diego López e, como numa súbita calmaria em meio à tempestade, foi concluído com a sutileza, frieza e precisão de um consciente chute colocado do brasileiro. Seu segundo tento. 2-1, este placar tão repetido ao longo do pragmático ano madridista nada tinha dos seus jogos feios e calculistas das rodadas anteriores, naquele domingo.

Exatamente por nada se assemelhar às vitórias "para o gasto" que marcam esta equipe mecânica, o jogo do Madrid não se manteria nos 2-1. Feroz, ele não permitia descuidos. "Trinta minutos, o time parou, e ainda tem um saque de esquina para eles... é hora perigosa", disse um aficionado próximo a mim. Era a certeza de quem conhece a equipe para que torce. No minuto 75, o escanteio do Villarreal fez a zaga madridista de espectadora, e o impensável segundo gol saiu, deixando tudo empatado com o tempo cada vez mais escasso. Entretanto, a mesma certeza e conhecimento do Madrid que previra o gol anterior agora fazia o Santiago Bernabéu pulsar e empurrar a equipe ao ataque - se o tempo era escasso, os cânticos, fortalecidos após a igualdade, fariam cada minuto ser dobrado, triplicado, estendido até quando fosse necessário.

E pouco foi necessário. Em apenas um minuto, o empate sumiu, por uma nova e última vez, do placar. Robinho, sempre ele, arremessou rapidamente um lateral para Gago, que vislumbrou Sneijder entrando pelas costas da zaga e mandou o lançamento. Preciso, letal, vitorioso. O holandês deu todo o fôlego de alguém que acabara de entrar em campo para alcançar a pelota, vencer o arqueiro Diego López e atingir as redes. O marcador em 3-2, embora o juiz tenha dado jogo para além dos acréscimos, não veria mais alterações. Ali, a parcos metros dos meus olhos, o melhor líder das principais ligas européias vencia mais uma partida na sua campanha, chegando a 53 pontos e abrindo nove para o Barça. Por aqui, a dúvida já não é mais se o Madrid será campeão: é saber se os blancos conseguirão atingir os 100 pontos.

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