segunda-feira, 30 de abril de 2007

Paixões interioranas

Há algumas semanas, o presidente do Juventude, de Caxias do Sul, Iguatemy Ferreira Filho, questionado sobre a possibilidade de um clássico Ca-Ju (Caxias e Juventude) na final do Campeonato Gaúcho, afirmou que "estava torcendo pelos dois times da cidade, pois Caxias do Sul, Pelotas (RS), Santos (SP) e Campinas (SP) são as únicas cidades de interior, no Brasil, que dão apoio total aos seus clubes". A expectativa de clássico caxiense não se confirmou, pois o Caxias acabou sendo eliminado pelo Grêmio, mas a cegueira da declaração do senhor Iguatemy permanece latente.

O sucesso de seu time parece ter feito o presidente fechar seus olhos, lembrando e equiparando-se aos grandes centros interioranos, em detrimentos a tantos outros locais de apoio total a seus clubes, mas que são injustiçados ou esquecidos pela falta de vitórias no campo. Iguatemy não precisaria ter ido muito longe para ver o absurdo do que falou, ao afirmar que só aquelas quatro cidades apoiavam inteiramente seus clubes. Ou será que as também gaúchas cidades de Passo Fundo, Rio Grande, Bagé, Santa Maria, Cruz Alta, Ijuí, Santana do Livramento, São Borja e tantas outras, foram temidas em tempos passados por mero acaso?

Verdadeiras batalhas foram e ainda são travadas no interior gaúcho e, pode-se ter certeza, só ocorrem porque há sim um apoio total das cidades aos seus clubes. Para ficar em apenas um exemplo: Passo Fundo orgulha-se até hoje das glórias obtidas em tempos passados, quando a histórica dupla de zaga, formada pelos irmãos Pontes (Daison e João), honrava as cores do clube citadino, pondo medo em quem viesse pelo caminho. Atualmente, o principal clube local, o Gaúcho, vive péssimas condições, tendo sido rebaixado no campeonato estadual e sem dinheiro para viagens e salários - mesmo assim, a apaixonada cidade conseguiu manter seu clube, que se não é mais competitivo, ainda leva a alma ao gramado cada vez que entra em campo. Talvez, mesmo sem sucessos em campo, vejamos aí mais paixão do que na badalada Caxias do Sul, pois em Passo Fundo a comunidade uniu-se em torno do clube e não em torno de seus resultados. É, mas o esforço descomunal dessa e de tantas cidades pelo interior gaúcho (com seus clubes em melhor ou pior situação) para manter seu futebol vivo é inválido, esquecido e enterrado, pois "só Caxias do Sul, Pelotas, Santos e Campinas apóiam seus clubes totalmente" - claro, pois é muito fácil lembrar de quem se destaca, esquecendo das pequenas lutas diárias de quem não tem como brilhar, mas não esmorece jamais.

Só o exemplo gaúcho bastaria como indignação total ao "esquecimento" do senhor Iguatemy em relação a outras forças do interior. Mas podemos subir mais no mapa brasileiro. Podemos chegar a Santa Catarina e vermos Chapecó, Criciúma, Joinville, Brusque, Ibirama, Itajaí, etc... apoiando seus clubes a 100%. Podemos ir ao Paraná, aos estados do Centro-Oeste, do Norte ou do Sudeste e encontrarmos outras dezenas, ou talvez centenas, de cidades interioranas que sustentam seus clubes pela paixão que carregam no peito, sem se importar com seus resultados, sorrindo apenas ao ver sua comunidade representada por aqueles onze jogadores. Podemos ir ao exemplo máximo do Nordeste, onde cada cidade interiorana mata um leão por dia para conseguir manter suas equipes. Lá do Nordeste, inclusive, vem talvez o único exemplo de clube do interior com mais torcida que os da capital do estado: o Treze, de Campina Grande (Paraíba), superando os clubes de João Pessoa em aficionados. Enfim, podemos chegar a cada rincão espraiado deste Brasil e encontrarmos um exemplo de apoio incondicional aos clubes locais, lutando jogo a jogo para manter seu ideal.

Mas não, "só Caxias do Sul, Pelotas, Santos e Campinas dão apoio total aos seus clubes no interior do Brasil", é o que somos obrigados a ouvir...

Nenhum comentário: