domingo, 22 de fevereiro de 2009

O primeiro time de Dunga, contra os profissionais

Coronel Barros é um pacato município da região noroeste do Rio Grande do Sul, emancipado de Ijuí em 1992, com população total estimada em pouco mais de 2,5 mil pessoas no ano passado. Lá, a imortal chama da paixão futebolística também existe – e é mais bem representada pelo grande clube local, o amador Ipiranga.

Quem revelou a sua história ao Futebesteirol foi o prefeito da cidade e ex-presidente do clube Olivar Scherer*, na tarde deste domingo, enquanto aguardávamos o confronto amistoso entre a equipe coronel-barrense e o profissional Santo Ângelo, que se prepara para a Segundona Gaúcha.

O futebol da localidade foi a princípio defendido por um certo Sete de Setembro, clube tido como o pioneiro de Coronel Barros. Aquela primeira equipe foi desativada no período da Segunda Guerra Mundial – muitos dos seus jogadores ainda falavam alemão e preferiram se resguardar diante da perseguição sofrida à época pelos descendentes de germânicos no Brasil. Quando o esporte ressurgiu, em 21 de abril de 1954, o fez sob o nome do Sport Club Ipiranga.

O fundador foi Hélio Wissmann, auxiliado por entusiastas das famílias Scherer, Weiler, Vontobel, Kronbauer (o estádio do clube, inclusive, chama-se Ervino Kronbauer), entre outras. Como a maior parte dos primeiros jogadores torcia para o Internacional de Porto Alegre, o escudo da equipe usava, no início, um emblema com o S, o C, e o I entrelaçados, a exemplo do colorado da capital. Só muito mais tarde o Ipiranga mudaria o escudo e o nome, adotando o atual Sociedade Esportiva e Recreativa Ipiranga.

Sem jamais interromper as atividades, o Ipiranga hoje vive de disputar amistosos e torneios citadinos ou regionais. O prefeito lamenta o sumiço de equipes tradicionais, como o Renner da Linha Oito e o Grêmio de Coronel Barros. Recorda-se dos tempos em que a localidade era distrito de Ijuí e o Ipiranga sempre participava do Campeonato Ijuiense Amador – nos anos 1970, chegou a jogar o Campeonato Polo Regional, contra equipes de Ajuricaba, Augusto Pestana, Catuípe, Santo Ângelo, Tupanciretã e Pejuçara, e foi vice-campeão.

Na atualidade, existem em Coronel Barros três equipes ativas: além do Ipiranga, há o Manda Brasa e os Amigos de Coronel Barros. Mas o prefeito Scherer avisa: “aqui, dos nossos campeonatos municipais, os que saíram o Ipiranga foi campeão”. Não é de surpreender, frente a uma estrutura tão orgulhosamente mantida apesar do amadorismo. Conta Scherer que, para mais que o futebol e o seu estádio na beira da estrada, cujo terreno foi comprado com os fundos arrecadados em festas e promoções, o Ipiranga possui uma sede social no centro da cidade. Ressalta: “o Clube Ipiranga é propriedade do time de futebol Ipiranga – os dois são a mesma entidade”.

Mas talvez o principal ponto da história do clube seja o de ter sido o primeiro pelo qual Dunga jogou. O capitão do tetra mundial em 1994 e atual treinador da Seleção Brasileira tinha 14 anos quando, em 1977, assinou a sua primeira ficha como jogador de futebol, ingressando na equipe infanto-juvenil do Ipiranga de Coronel Barros. Pouco tempo depois disputaria na sede do município de Ijuí o seu primeiro campeonato pela categoria, indo a seguir ao também amador Ouro Verde, do Bairro Assis Brasil, para depois começar a vitoriosa carreira profissional.Olivar Scherer considera a presença de Dunga nos registros do clube “um dado muito importante na história do Ipiranga”, e nos presenteia com um relato das primeiras partidas do volante no campinho de Coronel Barros: “Lembro-me perfeitamente, um dia nós sentados nesses bancos. O Valdir Aguirre, que era o padrinho do Dunga, ao lado do Edelceu (pai de Dunga), dizia assim: ‘o meu afilhado vai dar um bom jogador, ele é um verdadeiro patrolão, só que eu tenho que botar ele em forma física; ele está muito gordo, muito largão’.” Como se viu, Aguirre não deve ter falhado na tentativa de botar Dunga na linha, e o resultado foi um jogador capaz de dar nome a toda uma era do futebol brasileiro.

Bueno. Conhecido o Ipiranga, era hora de ver como a equipe de 2009 resistiria a um amistoso diante do Santo Ângelo, um rival tradicional do São Luiz, que há alguns anos luta para sair da Segundona Gaúcha – em dificuldades financeiras, o clube não participou da edição do ano passado e, segundo o treinador Mazarópi, ex-goleiro campeão do mundo em 1983 pelo Grêmio, “teve que iniciar tudo da estaca zero”.

Mesmo assim, eram profissionais. Embora os amadores do Ipiranga jogassem com uma raça genuína, a raça que só têm os que jogam pelo amor puro e simples ao esporte, segurar seria complicadíssimo. O grande público que preferiu ir prestigiar o time local, deixando de lado a partida do Internacional que a tevê trazia, viu uma equipe lutadora, que teve dois expulsos (Polaco aos 37 minutos e Kalil aos 66 - por acordo entre os times, ambos foram substituídos por reservas para não aumentar a diferença técnica), não se acanhou em dar entradas viris, mas... terminou goleada.

Ao intervalo o Santo Ângelo vencia por 0 a 3. Williams deu um giro sobre a marcação antes de chutar para abrir o placar aos 10 minutos, Edmar dobrou a vantagem aos 30, encobrindo o goleiro Rosinei, que cobrou mal um impedimento, deixando a bola nos seus pés, e Divo ensaiou a goleada aos 38, de cabeça. Os melhores momentos do Ipiranga haviam sido um pênalti que os visitantes cobraram na trave e o goleiro salvou o rebote, aos 33 minutos (vídeo abaixo), e uma bola na trave acertada por Taison, que não é o do Inter, aos 40, no que foi o melhor ataque coronel-barrense de toda a tarde.



Enquanto as equipes descansavam dentro do próprio campo de jogo, aguardando o reinício da partida, alguns torcedores dirigiam-se à cancha de bocha localizada dentro do pavilhão do clube (foto à esquerda, acima), mostrando que ali, ao menos, eram imbatíveis. As rádios santoangelenses, que transmitiram a partida na caçamba de caminhões, tiveram trabalho para anunciar todas as substituições que viriam no segundo tempo. Numa das muitas, o Ipiranga mandou ao gramado o camisa 16 Leandro que, além de ser zagueiro, exerce as funções de vereador em Coronel Barros. Um bom vereador, provavelmente, a julgar pela convicção com que dá chutões afastando o perigo da sua área.

Nem vinte substituições, porém, reporiam o gás do Ipiranga para conseguir igualar o físico dos visitantes. No segundo tempo, o time não atacou – e levou seis gols, dos quais quatro valeram. Williams mandou um voleio para fazer 4 a 0 aos 54 minutos, Edmar colocou uma bola maravilhosa no ângulo esquerdo do goleiro reserva Alex, aos 60, e Roberto marcou o sexto e o sétimo, aos 65 e 89 minutos.

Difícil prever o que esperar do Santo Ângelo na Segundona baseado no encontro deste domingo. Mazarópi, que não mostrou desprezo à partida de hoje, disse que apesar disso já pediu para a sua direção marcar mais dois amistosos contra equipes não-amadoras. Porque, como sói ser em duelos contra amadores, hoje não houve grande exigência aos jogadores missioneiros.

Azar. Essa iniciativa dos clubes maiores de fazer amistosos nos rincões onde o profissionalismo não tem como ser sustentado, algo que o São Luiz tem repetido nos últimos anos também, é excelente. Num estado em que times como a tal Ulbra de Canoas, que mal botam trinta espectadores no estádio, disputam o estadual e vão bem, valorizar as equipes amadoras donas de história é essencial. O acanhado e bem arrumado estádio de Coronel Barros, por exemplo, encheu para ver o time local se apresentar numa partida em que tinha pouquíssimas chances de vencer. Lotou por uma paixão e uma tradição que começam cinco décadas atrás, passam por glórias, passam por Dunga, e são fortalecidas em jogos desse tipo.
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* Olivar Scherer é natural de Coronel Barros. Foi professor por 20 anos na Escola Rural local, professor e diretor na atual Escola Estadual de Ensino Médio Rui Barbosa, de Ijuí, e também trabalhou na Escola Técnica 25 de Julho. Na política, foi vereador e vice-prefeito de Ijuí. Aposentou-se como professor na época em que Coronel Barros se emancipava e foi convidado a se candidatar a prefeito. Elegeu-se três vezes, incluindo o atual mandato.

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Amanhã no Futebesteirol, uma entrevista exclusiva com Mazarópi.

2 comentários:

Marcelo disse...

Bah Tche, isso que estar tao proximo, de um lugar que e sua casa estando tao longe. Quando Vi aquela porta dos vestiarios, lembrei quando jogava no mirim do ECRI Cascao era o presidente o Tirinha era nosso tec e depois o Beja, nossa que tempo bom foi aquele, isso sim sao lembranças boas de uma infancia pura. Sem palavras para dizer como e importante se ter base, Ja vivi em varios lugares desse mundo conheci ja um bocado mas tenho uma saudade de vcs dessa gente. Todo mundo fala '' que fim do mundo '' mas digo que nao e e + digo que ai e o inicio pode nao ter tudo que uma cidade grande comporta, mas ha uma coisa, quem sai dai sao pessoas com dignidade carater e prontas para enfrentar o mundo. Nao e onde o Judas perdeu as Botas nao, ai e uma terra abençoada, pode ser pequena sim mas grande em amor todos falam uns dos outros mas no fundo e porque se amam e querem o bem a todos por mais que nao seja o meio inviavel, mas e assim mesmo. Pquenas cidades pequenos problemas Grandes cidades problemas que nunca acabam.Ma s essa cidade comporta um grande amor e carinho confiança, amizade, paixao, digo isso porque tenho saudades, saudade porque sou cria da terra e foi dai que aprendi os primeiros passos pra vida.


Um abraço a todos e para os que ficarao e que continuarao e cotinuarao fazendo nao so do CERI um marco Futebolistico , mas dessa cidade CEL BARRENSE uma cidade exemplo e digna de se viver. Parabens a todos pelo historico e parabens pela dedicação!!!

Marcelo Tonenberg & Familia

Marcelo disse...

Veleu Gurizada e boa sorte!!!

Nos vemos no Fantastico um dia desses