terça-feira, 21 de abril de 2009

Insanidades

IJUHY – Um número randômico entre quinze e vinte pessoas disse que eu era louco por sair às oito e meia da manhã de sexta-feira de Santa Maria e embarcar numa cruel jornada de nove intermináveis horas em ônibus para me bandear até São José do Ouro. São José do Ouro, SJO para os íntimos, quase na fronteira com Santa Catarina, cidade simpática de sete mil habitantes encravada no meio de morros, morros e, bom, morros. Meia dúzia, no máximo, apoiou a ideia, sem grande convicção, de visitar a Laura num fim de semana qualquer.

“Então ela existe mesmo”, pensa alguém que leu textos passados e, sem saber quem era a pessoa citada – ou seja, todos os cidadãos que por acaso caíram no blog –, pensou que a gremista ourense era só uma invenção para salvar os escritos de dias sem inspiração. Pois existe. E fui. Equilibrando-me com uma mochila nas costas, outra pendurada no braço, cervejas irlandesas devidamente geladas (que obviamente esquentaram na primeira meia hora de viagem) e algum dinheiro no bolso, para o caso de descer na rodoviária errada, que são muitas as rodoviárias pelo caminho e poucos os motoristas de ônibus que se prestam a dizer em que canto estão parando.

Sucederam-se as cidades a partir de Santa Maria. Val de Serra, Júlio de Castilhos, Cruz Alta, Panambi – onde achei que encontraria ANÔNIMOS FURIOSOS –, Santa Bárbara do Sul, Saldanha Marinho, Carazinho e, cinco horas depois, Passo Fundo, a terra onde o banheiro masculino da rodoviária é tão guapo que se identifica como o W.C. dos PEÕES. Isso tudo só na primeira parte da viagem, que acabou às duas e vinte e dois da tarde – oito minutos antes da saída do ônibus rumo a SJO. De Passo Fundo às terras ourenses não há muito mais que cem quilômetros de distância. Mas num ônibus que mais parece viação urbana, incluindo cordinhas e alarmes para pedir parada no meio da estrada, cem quilômetros de distância são percorridos em mais de três horas.

E cidades e cidadezinhas no caminho. A primeira foi Coxilha, onde avistei uma bandeira do São Luiz. Tá, não era uma bandeira do São Luiz, mas eu nutri a ilusão por uns dois segundos doces, e continuo sem saber que raio de time ou instituição usa as cores vermelha e branca e um escudo no mesmo formato do clube ijuiense. Depois, Tapejara, Ibiaçá e Sananduva. Um pouco antes de SJO ganharíamos a companhia de um bêbado. Nunca faltam bêbados em viagens assim, alguém ainda vai escrever uma tese sobre isso. Cobraram-lhe três reais pela passagem. Ele deu dez, e passou os minutos seguintes pedindo “o troco dos meus CENTECINQUENTA”. Não ganhou, e ainda ouviu ameaças de que seria deixado no primeiro barranco que surgisse.

Pois bem. Cinco e pouco da tarde, chegada a São José do Ouro, entrada no inolvidável Hotel Ribeiro, com um quartinho claustrofóbico, e tour guiado pela cidade. Em meia hora de caminhada está conhecida SJO, sua igreja azul, seus morros, sua praça, seus morros, sua prefeitura, seus morros, seus colégios, seus morros, seu ginásio e, também, seus morros. A noite de sexta-feira foi para enriquecer o currículo. Depois de ver confrontos entre times semiprofissionais franceses, jogos da Liga Andorrana, rodadas de Gauchão e Segundona Gaúcha, mas também jogos de Brasileirão, Libertadores e Campeonato Espanhol in loco, agora posso contar que assisti a algumas partidas do Campeonato Ourense de Futsal. Cancheiro por demais. Ou louco, como disseram os cerca de quinze ou vinte brasileiros consultados na pesquisa do Ibope citada lá no primeiro parágrafo.

Oquei, estava sonolento da viagem e nem me prestei a pedir as súmulas das partidas. Fiquei sem saber o nome dos times futsaleros, os resultados e tudo o mais que interessa. Só via as marcações do número total de faltas em plaquinhas mostradas pelos árbitros de mesa. Enfim, quem mais jogou naquela noite foi a equipe genérica que vestia um belo uniforme parecido com o do Boca Juniors. Até onde eu contei tinham feito quase dez gols – precisão na informação é para os fracos – e só haviam sofrido um, improvável, no fim.
Quase um Internacional massacrando o Caxias, como se veria dois dias depois nesse final de semana de insanidades. O sábado das cervejas irlandesas e do costelão no glorioso GRÊMIO GUARANY de SJO, também foi o sábado da Ponte Preta classificando-se para tentar seu segundo título relevante em quase 109 anos de existência (o modesto Campeonato do Interior, para somar à Segunda Divisão Paulista de 1969), do rico Palmeiras fracassando novamente e caindo em casa para o Santos, do Diego Souza e do Domingos brincando de lutinha.

Depois, o domingo, também com as suas loucuras, excetuado o desfecho do Campeonato Pernambucano com mais um título do Sport. Mesmo a conquista óbvia do Inter no Rio Grande teve ares de legenda, com a taça erguida de forma invicta no ano do centenário após um novo 8 a 1 em decisão, e gremistas melancólicos pelas ruas de SJO, como o da foto do topo, à esquerda. No Morumbi, o gordo Ronaldo dava uma arrancada ao estilo dos melhores tempos e fazia o segundo gol dos 0 a 2 do Corinthians sobre o São Paulo e, no Rio, o Flamengo vencia o Segundo Turno com um sensacional GOL CONTRA dum botafoguense, garantindo uma final para o certame de 2009. Cobrindo tudo, o Sportv discutia com a maior seriedade do mundo se o técnico Cuca, afinal, tinha ou não trocado de camisa no intervalo da partida carioca.

Uma questão de tal relevância para o andamento do esporte bretão no país mereceria todos os espaços nos debates esportivos da primeira noite de campeões do ano. Mas, enquanto a tevê se prendia nessa discussão-de-sexo-dos-anjos e os colorados estouravam seus foguetes nos céus de SJO para anunciar o Inter campeão gaúcho, chegou pelo celular a mais aguardada notícia desses dias: o resultado do jogo de sexta-feira pela Segundona. Abrindo o returno lá em Carazinho, o amado, idolatrado, salve, salve, Milan castilhense bateu o Atlético local por fenomenais QUATRO A DOIS, conquistando sua segunda vitória e saindo da posição de saco-de-pancadas para a de flor-de-lótus postulante a vaga na próxima fase. Classificar-se-á, o rubro-negro, com direito a toda a pompa da mesóclise.

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